O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) ajuizou ação, com pedido de liminar, para que não seja autorizada a entrada de novos segurados na Ala de Tratamento Psiquiátrico (ATP), na Penitenciária Feminina do Distrito Federal, conhecida como Colmeia. O local é utilizado para o cumprimento da medida de segurança sob o regime de internação, que é aplicada ao inimputável ou semi-imputável que pratica crime. A ATP possui capacidade para abrigar 50 pacientes, mas, no momento, é ocupada por aproximadamente 106 internos.
Na ação, o MPDFT argumenta que a ATP é uma ala prisional, atualmente com nove celas, todas superlotadas e sem nenhuma característica de instituição hospitalar estruturada para oferecer tratamento aos internos submetidos à medida de internação. A estrutura física não é adequada para a realização de atividades terapêuticas nem para os demais serviços de que os internos necessitam. Além disso, não existe enfermaria para repouso ou para atendimentos emergenciais e sequer há plantão da equipe de saúde durante o período noturno e nos finais de semana.
Um dos problemas mais graves observados na ATP é a ausência de separação entre os internos portadores de transtornos mentais e aqueles com dependência química. Há, inclusive, internos com transtorno de personalidade antissocial (psicopatas) junto aos demais segurados. A não separação dos internos causa sérios problemas tanto para os internos como para os profissionais que trabalham na ala. A atual situação contribui para que ocorram atos ilícitos, como tráfico de entorpecentes, homicídios e estupros, além de suicídios.
O Ministério Público também constatou que os recursos humanos são insuficientes e os profissionais tanto da área da saúde quanto de segurança não receberam capacitação para trabalhar com os pacientes judiciários. As condições de cumprimento da medida observadas na ATP não permitem que se atinja a finalidade da medida de segurança, que é o tratamento e a reinserção social do segurado, além de contrariar a Lei 10.216/2001, que trata da reforma psiquiátrica.
As Promotoras de Justiça de Execuções Penais Alvarina de Araújo Nery, Cleonice Maria Resende Varalda e Helena Rodrigues Duarte pedem, liminarmente, que não seja autorizada a entrada de novos segurados na ATP, até que o Governo do Distrito Federal (GDF) adote as seguintes medidas, conforme previsto na Lei de Reforma Psiquiátrica (Lei 10.2016/2001):
a) estruture a execução da medida de segurança em ambiente físico adequado para oferecer assistência integral à pessoa com transtorno mental, incluindo serviços médicos – também na forma de plantão –, de assistência social, psicológicos, ocupacionais e de lazer;
b) elabore e implante programa técnico específico que contemple as diretrizes das áreas de saúde, segurança, assistência social, educação, formação profissional, cultura e lazer para o interno;
c) disponibilize equipes de profissionais suficientes e capacitadas para o atendimento adequado aos submetidos à medida de internação.
Para as promotoras de Justiça, a ATP foi um "arranjo" feito para acomodar os internos que cumprem medida de segurança na modalidade de internação. "Não há uma política pública própria do GDF. Constata-se a total distância entre o modelo definido pela Lei e a realidade a que estão submetidos os segurados no DF. Tal situação, por força dos princípios constitucionais, em especial o da dignidade da pessoa humana, não pode ser tolerada pelos órgãos encarregados de zelar pela segurança e saúde dos cidadãos", diz a ação.
Medida de Segurança
A aplicação da medida de segurança envolve, por um lado, o aspecto de atenção psicossocial – o tratamento a ser dado à pessoa com transtorno mental que representa perigo para si e para toda a coletividade – e, por outro, o aspecto atinente ao direito penal e à segurança pública – punição do mal causado e manutenção da ordem e da paz social. Uma vez configurada a inimputabilidade, o juiz absolve o réu, aplicando-lhe, contudo, a medida de segurança.
O art. 96 do Código Penal dispõe sobre as espécies de medida de segurança. Elas podem consistir em sujeição a tratamento ambulatorial ou internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou, na falta desses, em outro estabelecimento que seja adequado às peculiaridades que a medida impõe.
Apesar de já terem decorridos mais de dez anos da publicação da Lei 10.216/2001, os internos da ATP não foram alcançados por ela. "Enquanto a Reforma Psiquiátrica preconiza a extinção dos Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico no Brasil, por não atenderem ao novo modelo de assistência integral à pessoa portadora de transtornos mentais, no DF, a medida de segurança é cumprida em penitenciária. Isso significa dizer que o DF está em situação muito pior do que todos os estados", ressalta a ação.