O Núcleo de Direitos Humanos (NDH) do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), por meio do Núcleo de Enfrentamento à Discriminação (NED), expediu, na primeira semana de agosto, ofícios com questionamentos sobre a ação conjunta de órgãos públicos do DF que resultou, em 19, 20 e 28 de julho, no recolhimento de pertences e documentos de pessoas em situação de rua em vários locais no DF como no Setor Comercial Sul, na L3 Sul, na Rodoviária do Plano Piloto e em Taguatinga, próximo à Praça do Relógio.
Foram oficiados os responsáveis pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (SEDES), pela Secretaria de Proteção da Ordem Urbanística (DF Legal) e pelo comando da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF). Dentre outros questionamentos, os gestores terão de prestar informações acerca do planejamento da ação, como a formalização do ato de apreensão dos bens, destinação dos objetos e disponibilização de serviços visando a garantir direitos dessa população.
“Esse tipo de atuação estatal é desumana e violadora do vetor máximo da República Federativa do Brasil, a dignidade da pessoa humana, notadamente ao se considerar que a pandemia da Covid-19 deflagrou uma crise econômica mundial, atingindo severamente as pessoas mais vulneráveis, em especial as pessoas que vivem nas ruas, impactadas com a carência de recursos advindos das medidas de isolamento e da dificuldade de acesso às políticas públicas de assistência social” avalia a coordenadora do NED, Promotora de Justiça Mariana Nunes.
O ofício também salienta o recebimento de notícias dando conta que houve irregularidades nas abordagens realizadas pela PMDF e demais órgãos que participaram da iniciativa, situação que contraria recomendação do MPDFT emitida em 15 de julho. Na recomendação nº 03/2021, o NED/NDH, o Núcleo de Controle da Atividade Policial (NCAP), as Promotorias de Justiça Militares e as Promotorias da Infância e Juventude, esclarecem que no momento da abordagem, os agentes “devem portar crachá ou outra forma de identificação funcional, em lugar visível e durante todo o decorrer do trabalho com aquele grupo populacional”.
Também informam que “as abordagens deverão ser filmadas, e as imagens preservadas por, pelo menos, seis meses”. Além disso, a recomendação também especifica que a apreensão de bens pessoais e documentos precisa ocorrer nas estritas hipóteses legais e mediante a lavratura de auto com essa finalidade. Entre outros pontos, a recomendação também elenca a proibição da realização de ações vexatórias e atentatórias contra as pessoas em situação de rua por parte dos agentes de segurança que, também, devem impedir esse tipo de prática por terceiros.
Diante do conhecimento das ações e após o recebimento de vídeos e notícias sobre a ação de apreensão de pertences pessoais da população em situação de rua, tais como cobertores, panelas, documentos pessoais, roupas, barracas, comida, sem a observância da legislação aplicável, o Núcleo solicitou reunião de emergência com o DF Legal, SEDES e Secretaria de Segurança Pública (SSP), que ocorreu dia 29 de julho, e contou com a presença de vários atores que atuam na defesa dos direitos humanos, tais como a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos, Cidadania, Ética e Decoro Parlamentar da Câmara Legislativa do DF (CLDF), o Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos da Defensoria Pública do DF e a Comissão de Direitos Humanos da OAB/DF. O objetivo da reunião foi compreender as motivações das operações realizadas pelo governo do DF e reafirmar a necessidade de cumprimento da Constituição Federal e da legislação voltada à população em situação de rua.
Recentemente, o NED também se manifestou, como fiscal da ordem jurídica na Ação Civil Pública nº 0706244-77.2020.8.07.0018, ajuizada pelo Instituto Cultural e Social no Setor e outros, contra a ação do GDF realizada no SCS no dia 19 de setembro de 2020, onde também foram apreendidos bens pessoais e realizados atos que violam os direitos fundamentais da população em situação de rua. Ainda segundo o NED, essas operações são frequentes no DF e cada vez mais o Ministério Público é acionado com objetivo de assegurar que os direitos das pessoas em situação de extrema vulnerabilidade social não sejam violados.
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