Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT
Observem estas duas posições:
1 – O Brasil é um país violento, com volume de assassinatos na estratosférica casa dos 60 mil por ano, afora infindáveis roubos, estupros, tráficos etc. São necessárias medidas duras contra a criminalidade. É de uma ingenuidade bisonha exigir cordialidade em situações de rua, que envolvem sujeitos organizados, fortemente armados, dispostos a atirar para matar. O policial é um servidor público (antes disso, um pai de família, um ser humano) que exerce função espinhosa, nem sempre reconhecida, com riscos reais de morte e altos índices de depressão, alcoolismo e suicídio.
2 – A polícia é o braço mais nítido da força bruta do Estado. Com frequência age de maneira arbitrária, detendo pessoas fora das hipóteses estritamente legais e revirando residências sem mandado judicial. Isso quando não tortura ou mata. Direitos constitucionais são sonegados ou disfarçados. Policiais são corporativistas e se protegem, além de perseguirem quando denunciados. As pessoas têm mais medo do que confiança na polícia, e por vezes preferem nem perder tempo procurando-a.
Qual delas procede? As duas. Em grande parte, ambas estão corretas. O desafio de se achar uma harmonia ótima entre os direitos do preso e os interesses da sociedade passa pelo escrutínio por inteiro da verdade, e não com o contentamento de traços de realidade que criam, digamos assim, redemoinhos viciosos que se compensam precariamente. Por exemplo, poder-se-ia usar de rigor na análise dos métodos policiais se o Brasil fosse um país seguro; se não, pequenos abusos são objeto de tolerante vista grossa ou são desprezados como miudezas de mau gosto. Um ministro da Suprema Corte americana dizia que o grau de maturidade de uma nação pode ser medido pela maneira como vivencia seu direito criminal.