Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT
Não sei quem foi o primeiro a dizer que a Amazônia é o pulmão do mundo. Desconheço como chegou a essa conclusão e como a passou adiante, mas o fato é que isso cresceu a ponto de colar no imaginário popular e ser repetido ad nauseam, no Brasil e no mundo. E continua. Há poucas semanas o grande ator Leonardo DiCaprio, o grande jogador Cristiano Ronaldo e o Macron falaram isso e ainda cravaram a capacidade respiratória da floresta: a produção de 20% do oxigênio mundial.
A própria imagem é infeliz, pois o pulmão não produz nada. A respiração pulmonar não consiste na produção e sim em uma troca de gases. Nessa troca, o gás que sai do pulmão é o carbônico, e fica absorvido no organismo o oxigênio (presente em menos de 20% da composição do ar atmosférico) para a circulação da corrente sanguínea. Mesmo que a respiração pulmonar fosse criadora de gases, entre aspas, ela o seria do ar que os humanos descartam no processo, porque dele não precisam. O pulmão é um órgão egoísta.
As plantas, essas fazem o inverso, pois absorvem gás carbônico e liberam oxigênio. A ideia de que uma floresta gigantesca produz uma quantidade gigantesca de oxigênio faz sentido, evidentemente. E é verdade. Mas há anos se sabe que isso é tudo. O oxigênio amazônico não é exportado para o mundo e sim é quase todo consumido na própria floresta. Parece não haver dúvida nem controvérsia quanto a isso. O abandono da noção de “pulmão do mundo” não deveria ser uma atitude desconfortável, mas um padrão de conhecimento que foi superado por novas descobertas científicas. Ideias erradas são descartadas e pronto. É assim que a humanidade se aprimora intelectualmente, sempre no sentido da apreensão da realidade, quer isso pareça agradável, quer não.
O problema é continuar agarrado a ideias comprovadamente falsas, por desinformação ou de propósito, ou seja, por má-fé.
Jornal de Brasília - 25/9/2019
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