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Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT

Uma das utilidades do VAR no futebol é auxiliar na interpretação das jogadas. A decisão compete ao árbitro que está no campo e a revisão apenas sugere que ele assista às imagens no detalhe e confirme ou volte atrás no que havia apitado. Ele pode até se recusar a ir ao monitor, se estava perto do lance e sua convicção é firme.

Já o impedimento não é questão de interpretação e a revisão comunica o árbitro: estava mais à frente do zagueiro ou não estava. O gol foi legal e merece ser validado ou foi irregular e deve ser anulado.

Certo? Errado.

O que ninguém imaginava era que o impedimento também é lance de interpretação. Alguns são fáceis e a olho nu tudo se resolve. Mas aquelas fotografias com uma linha para tirar a dúvida sobre a posição do atacante mostra um problema inesperado, que é justamente a espessura da linha. Se fosse bem fininha, como um fio de nailon, e a câmera conseguisse se aproximar a ponto de se vê-la, seria fácil matar a charada. É o que acontece no tênis, onde é tudo preto no branco. A bola saiu ou não saiu. Quando um dos tenistas pede o “desafio”, a câmera se aproxima até se avistar os pelinhos da bolinha. A torcida reage com um “oh”.

Vejam bem: não estou falando de esportes, mas daquilo que em filosofia da ciência se chama de “epistemologia”, que é a investigação sobre a natureza do conhecimento. Ou seja, o conhecimento do conhecimento. “Como você sabe disso?” é a pergunta epistemológica por excelência. Nós a fazemos a toda hora. As crianças a fazem quando descobrem que os adultos sabiam algo que elas não sabiam ou que achavam que eles não sabiam – o que é divertido e desconcertante ao mesmo tempo.

Nós fazemos a pergunta epistemológica para nós mesmos, silenciosamente. O homem inteligente duvida de si próprio. Mas só até certo ponto. Depois ele precisa decidir se foi falta mesmo ou não.

Jornal de Brasília - 23/10/2019

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