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Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT

Não devia ter sido fácil para Shakespeare ir à escola, lá pelos idos de 1570. Entrar às 6 da manhã (7 no inverno, quando ainda está escuro e decerto frio ou gelado), até o sueto, às 11, e depois até as 17:30 ou 18. Isso para estudar latim e aritmética.

Segundo algumas fontes, também se estudava inglês e música. Mas não há dúvida quanto aos clássicos em latim, esses eram lidos e decorados de segunda a sábado, o ano todo, sem férias. A metodologia de ensino era na base de exercícios repetitivos e violentos. A severidade dos professores não era apenas tolerada, mas esperada e até louvada.

A criança entrava com 6 ou 7 anos, mas já devia estar alfabetizada, o que é um detalhe curioso. Hoje em dia os pais não se preocupam com o a-b-c, pois a escola se encarrega disso (os extremamente inteligentes aprendem sozinhos, mas isso é exceção). Os garotos da época de Shakespeare já deviam saber ler (o que se fazia com uma tabuleta chamada “hornbook”, que continha um pergaminho com o alfabeto e o Pai Nosso), e alguém da família cuidava disso, provavelmente o pai, pois as mulheres não iam para a escola e, portanto, eram analfabetas ou, quando muito, eram precariamente letradas e apenas rubricavam o nome.

Era a imersão no latim que abria as portas para um mundo civilizado, com a perspectiva de se ir para a universidade e ser alguém. A decisão de se matricular o pequeno William – e não colocá-lo em trabalhos agrícolas ou no comércio – tinha algo a ver com orgulho e status. Seu pai valorizava as convenções sociais e tentou comprar um brasão da família Shakespeare. Não conseguiu. Foi o Bardo que o fez, anos depois, não sem protesto de que a prática estava se banalizando.

Como calcular o impacto que a escola teve na vida de Shakespeare, não dá para saber. Mas, que dessa escola, em séculos, saiu um Shakespeare, um único, isso se sabe.

Jornal de Brasília - 27/2/2020

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