Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT
Machado de Assis era filho de Francisco José de Assis e Maria Leopoldina Machado Câmara. O pai era um pardo forro ou, mais provavelmente, um preto forro (na época se dizia “preto” e não “negro”). “Forros” eram os escravos que tinham sido alforriados, ou seja, conquistaram a liberdade por benevolência de seus donos ou porque compraram a carta. De acordo com censo de 1819, os forros eram minoria mas não eram tão poucos: 159.500 contra 1.728.000 cativos e 843.000 brancos.
Francisco de Assis era pintor de paredes e dourador.
Maria Leopoldina nascera em Ponta Delgada da ilha de São Miguel, nos Açores. Veio menina para o Brasil. Era branca mas pobre, trabalhava com costuras e bordados para família ricas. Portanto, era empregada doméstica. Vivia como “agregada” (uma figura típica do período) no morro em que Machado nasceu, o do Livramento. Era alfabetizada e possivelmente ensinou o filho a ler, mas morreu quando ele tinha 9 anos de idade. O casal teve outra filha, Maria Machado de Assis, que morreu de sarampo aos quatro anos.
Nada indicava que o maior escritor brasileiro do seu tempo e de todos os tempos fosse nascer de uma família modesta de agregados. Sua estreia literária foi em 1854, aos 15 anos de idade, no jornal “Periódico dos Pobres” (sic). Em um poema de sofrível qualidade literária, homenageava uma mulher, uma tal Petronília. Embora ainda não fosse bom escritor – e nunca seria um poeta comparável ao prosador que foi –, ao menos tinha paixão pelas letras e cachimônia suficiente para enviar uma obra sua ao escrutínio público.
É muito charmoso se apresentar como “escritor” mas, ao fazê-lo, o sujeito se compromete não só a escrever bem e ser corajoso, mas conhecer todos os clássicos e semi-clássicos, dominar teoria literária e ser versátil, arriscando-se em traduções, libretos ou letras de músicas, roteiros de filmes etc.
Jornal de Brasília - 11/3/2020
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