Seu navegador nao suporta javascript, mas isso nao afetara sua navegacao nesta pagina MPDFT - O feminicídio e o papel da imprensa

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Raoni Maciel
Promotor de Justiça do Núcleo do Tribunal do Júri e Defesa da Vida do MPDFT

Nesta semana, em 9 de março, a Lei 13.104, que criou a qualificadora do feminicídio, completou 5 anos de vigência. Quem trabalha de perto com a tragédia do morticínio de mulheres em Brasília sentiu nesse período uma mudança significativa. Acima de tudo, a alteração da forma como a sociedade vê, e o fato de que agora vê esses crimes, foi uma autêntica revolução. A imprensa do Distrito Federal contribuiu positivamente para que isso acontecesse. Ao divulgar os casos, sobretudo as histórias trágicas por trás de cada caso, e ao cobrar justiça das autoridades constituídas, a imprensa, sem dúvidas, exerceu e exerce um papel fundamental nessa transformação.



A análise do fluxo do sistema de justiça criminal do DF no tratamento dos crimes de feminicídio consumados indica a entrega de justiça efetiva, rápida e rigorosa para esses crimes mais graves. Feminicídio consumado é aquele em que a vítima foi assassinada por razões do gênero feminino, seja dentro do contexto de violência doméstica, seja por menosprezo e discriminação à condição de mulher. O processo se inicia com o oferecimento de uma denúncia pelo Ministério Público, e passa por duas fases judiciais. Na primeira fase o juiz togado pronuncia o réu. Somente após a confirmação dessa pronúncia pelo Tribunal de Justiça é que acontece a segunda fase, em que o réu é finalmente julgado perante o Tribunal do Júri. Quem julga nessa última fase são 7 jurados sorteados dentre os moradores do local onde o crime aconteceu.

A mudança do tratamento que o sistema de justiça criminal dá ao crime de feminicídio pode ser ilustrada por meio de dois casos concretos. Em 1º de maio de 2012, no Itapoã, Renato assassinou sua ex-companheira Ana Paula da Silva com 18 golpes de faca, na frente dos filhos. Denunciado, processado e condenado pelo Tribunal do Júri, manteve-se em liberdade. Em nenhum momento foi considerado um perigo para o convívio social. Seis anos depois, aos 3 de setembro de 2018, em Santa Maria/DF, Josias desferiu diversas facadas em sua ex-companheira Simone de Sousa. Apresentada denúncia pelo Ministério Público, Josias foi imediatamente recolhido preso, e respondeu ao processo acautelado. Em 30 de janeiro de 2020 foi condenado a pena de 39 anos e 8 meses de reclusão. Permanece preso.

Analisadas as 68 denúncias de feminicídio oferecidas pelo Ministério Público nos crimes cometidos desde a promulgação da lei em 2015 até o ano de 2019, vemos que em 39 processos o réu já foi condenado pelo Tribunal do Júri. A média das penas aplicadas é de 21 anos, muito acima do mínimo legal de 12 anos. Não há crime cometido entre 2015 e 2017 que ainda esteja sendo processado, embora existam três casos em que o réu está foragido, e então o processo não pode começar até que sejam encontrados. Nesses três casos há ordem de prisão decretada. Mesmo dentre os feminicídios mais recentes, cometidos em 2019, 6 já estão pronunciados. Ou seja, estão com seus julgamentos marcados ou apenas aguardam eventuais recursos para serem julgados.

A aplicação da justiça no caso concreto, inclusive com a imposição da pena de prisão, possui importância por si só. Traz alento aos familiares das vítimas e afasta o agressor do convívio social, impondo-lhe a reprimenda definida em lei. No entanto, para que a pena possa contribuir com a prevenção de novos crimes, para que exerça sua função de prevenção geral positiva, ela precisa ser publicizada. A sociedade do Distrito Federal precisa tomar conhecimento deste novo cenário, em que a punição dos feminicidas é efetiva, rápida e rigorosa.

Nesse novo passo, mais uma vez, a imprensa do Distrito Federal terá papel fundamental. Muito embora a sessão plenária seja já um ato público e reverbere a aplicação da pena na comunidade local, somente a imprensa possui a capacidade de dar maior alcance à informação, comunicando o resultado dos processos a toda sociedade de Brasília. A punição dos feminicidas precisa aparecer nos jornais e ser estampada em suas páginas principais. Assim como o crime é noticiado nos telejornais, sua punição também precisa ser notícia de destaque. Todos no DF devem saber que a justiça será implacável na aplicação da lei.

Correio Braziliense - 16/3/2020

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