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Ivaldo Lemor Junior
Promotor de Justiça do MPDFT

Não existem retratos dos antepassados de Machado de Assis. Os avós eram escravos alforriados e, portanto, pretos (negros) ou pardos, dependendo dos critérios, nem que sejam empíricos ou intuitivos, de avaliação da pele e de traços fisionômicos em geral (observação: quando forro, o preto era “promovido” a pardo). A mãe era açoriana e branca.

 

Machado era um mestiço, digamos, mediano. Sua epiderme era um tanto escura mas seus cabelos e nariz tinham um quê mais caucasoide do que negroide. A última foto do escritor revela que o avanço da idade encardiu sua tez, dando-lhe um ar de Velho Zuza, de tal modo que é lícito imaginar que o pai poderia ter sido negrão e ele ficou no meio-termo de seus genitores. Mas não é impossível que o pai fora um pardo como ele e a mãe não tenha sido tão clarinha, como o lusitano prototípico. Nem irmãos germanos são idênticos nesses quesitos.

Quando Machado morreu, Joaquim Nabuco fez um comentário um tanto estranho mas que decerto tinha um escopo lisonjeiro: “para mim ele era branco”. E mais: “creio que por tal se tomava”. E mais ainda: “lhe doeria” ser chamado de mulato. Acontece que o alvejamento social de Machado, registrado desde já no atestado de óbito, não o torna melhor escritor do que ele foi. Ao contrário. Quanto mais dificuldade no processo, mais meritório o produto. Quanto mais pé rapado, tímido, sem instrução formal, epilético e gago, melhor. Quanto mais tenha vivido antes da égide da Lei Áurea, melhor.

Machado teve três amores na vida, três europeias, uma italiana e duas portuguesas. Todas eram mais velhas (duas delas, quase 20 anos) e quem sabe a questão racial fosse menos importante do que a projeção da imagem da mãe, que morreu quando ele tinha nove anos de idade. Seu pai recasou, mas é improvável que Machado tenha se dado com a madrasta, a mulata Maria Inês da Silva.

Jornal de Brasília - 10/6/2020

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