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Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT 

Carlos de Melo, personagem fictício do “Ciclo da cana-de-açúcar” de José Lins do Rêgo, entrou para a faculdade de direito na Paraíba e se formou bacharel. O que fez com seu diploma? Nada. Não atuou na advocacia nem em outra atividade forense. Voltou para o engenho do avô, no interior do estado, onde vivera na infância e, balançando-se na rede, cogitava sem entusiasmo fisgar alguma promotoria pública. 

Matava o tempo. Lia jornais. Leu um único livro, “Os Maias”. Pensava besteira. Fazia besteira. Era um leseira, um poltrão. Ninguém sabia disso melhor do que ele mesmo, pois admitiu ter “deplorável fraqueza de caráter”, “caráter de lama”; faltava-lhe “fibra, têmpera de homem”, em suas palavras.

Com a morte do avô, Dr. Carlinhos assumiu o engenho. E o fiasco veio. Inepto como só ele, não sabia de nada, não era obedecido nem respeitado por ninguém. Tinha dívidas impagáveis e os colonos passaram a lhe furtar deslavadamente sem que ele levantasse um dedo. O tio Juca, com quem não se dava, remiu suas letras de câmbio vencidas e pagou 300 contos de réis pela propriedade. Foi até gentil, ao dizer que “nem todo o mundo tem jeito para a agricultura”.

E se Carlos abraçasse para valer o direito? Seria um bom promotor? O que é um bom promotor? O que estuda muito ou o que trabalha muito? Ou os dois? O tipo inovador e industrioso ou aquele que passa 30 anos ali dentro e não cria nada mas está com a papelada em dia?

Carlinhos de forma alguma tinha má índole mas pergunto-me se teria jeito como criminoso acaso sua vida derivasse para a outra margem da lei. Nem todos os ladrões são competentes. Uns ficam entalados em grades ou são mordidos por cachorros; vacilam. Outros vacilam mais ainda e são presos em investidas das quais nem sabiam bem qual era o plano. Carlinhos dizia vacilar “como um pêndulo de relógio” e quem sou eu para discordar.

Jornal de Brasília - 21/7/2021

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