Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT
Paleontólogos do Canadá revisaram a taxionomia secular de insetos fósseis extintos há 10 milhões de anos. Tais animais eram considerados primos de libélulas modernas e agora pertencem a uma nova família, nomeada “Cephalozygoptera”.
O parágrafo acima são “os melhores momentos” do que se imagina que seja a atividade científica.
É compreensível o anseio à la Dr. Spock por precisão de fatos, exatidão de conceitos, explicações lógicas e certeiras – em suma, “comprovação científica” –, ao tempo em que se tende a rejeitar outros saberes que não prometem nada disso e são marcados por subjetividades e mistérios.
Elogio sublime é “pesquisador”, talvez mais do que “intelectual” ou “estudioso”. Um “filósofo” ou um “poeta” são figuras que transitam entre a irrelevância e a comiseração; tanto melhor se ao menos exercessem o magistério ou o jornalismo.
A ciência eliminou o “eu acho” porque tanto o “eu” quanto o “acho” são inconvenientes. Mas isso é só da boca para fora. Expulsos pela porta, insistem em voltar pela janela.
Hoje ou daqui a 50 ou 100 anos, integrantes de outras universidades podem revisar a novel definição das libélulas – congressos ou publicações acadêmicas não são tribunais – não só por motivos técnicos, como dados duvidosos ou conclusões precipitadas, mas também por razões bem mais mesquinhas, como ciúme, vaidade, ganância. É possível que personagens sociais de aspecto respeitabilíssimo, como professores eméritos, não passem de molecotes birrentos. Eu conheço gente assim e até pior.
Ainda assim, eventual recepção hostil da nova classificação é algo mais positivo do que negativo pois alto grau de exigência das novidades é o que porá à prova, ao fim e ao cabo, o próprio conhecimento humano e a linguagem que o veste, migrando-se rebus sic stantibus da voz ativa (reclassificaram) para a passiva (foi reclassificado).
Jornal de Brasília - 8/9/2021
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