Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT
Morre Olavo de Carvalho, figura pública que dividia admiradores e detratores. Os primeiros o viam como um erudito prolífico, um intelectual corajoso, gênio da raça. Outros preferiam chutá-lo como “filósofo autoproclamado”, “ideólogo ou guru da direita” e “astrólogo” (salvo engano, astrólogos nunca protestaram contra o uso pejorativo do termo, como se a ocupação em si fosse demeritória).
Ele próprio alimentava a controvérsia de sua imagem ao se expor nos meios modernos de comunicação, as redes sociais, onde postava textos irreverentes ou vídeos recheados de insultos e calão.
Mas o Olavo que deve ficar é o dos livros mais densos, a começar por sua assinatura, “O jardim das aflições”, e a culminar com sua obra-prima, os Quatro Discursos, que lançou um reexame respeitável do pensamento de Aristóteles. Foi Olavo quem popularizou Mário Ferreira dos Santos, Bruno Tolentino, Eric Voegelin, Louis Lavalle e tantos outros, em ensaios e aulas abrangentes sobre literatura, religião, política, moralidade, história, costumes.
E o mais notável: Olavo mostrou que existe vida inteligente fora do circuito burocrático de ensino e das universidades, que desprezava. Conhecimento é coisa que se adquire aboletando-se na cadeira e devorando um livro atrás do outro, num processo tão persistente quanto doloroso. Mas isso é uma coisa. Outra é a credencial que se apresenta aos outros à guisa de recompensa pelo esforço pessoal. Titulação escolar às vezes forja forma mais do que revela conteúdo.
Olavo escreveu que a obra de Gilberto Freyre foi objeto de aviltamento nos anos 1970 pelo “simples expediente” de ser rotulada de “conservadora” e “burguesa”. E que, em sua pátria, “o grande homem sofre vexames póstumos nas mãos de espíritos menores”. Quem sabe um dia não levem à colação de seu monte-mor bens cujos decalques foram limpos e transfigurados.
Jornal de Brasília - 2/2/2022
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