Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT

Ainda se fala muito em Karl Marx. Há uma clivagem renhida entre os que se definem como seus seguidores e os que o repudiam, ao argumento de que o autor alemão não apresentou teorias consistentes nem acertou suas previsões históricas. Isso quando não se invade sua vida particular, dedurando a lástima que foi como pai ou marido, ou sua integridade mundana.

Para ser marxista, a primeira coisa que você precisa fazer é ler Marx. A segunda é entender Marx. A terceira é concordar ou gostar. Você pode ser marxista por compartilhar suas ideias ou por achar que gosto é sinônimo ou consequência inevitável desse compartilhar. Mas talvez alguém encontre prazer na leitura de “O Capital” porque, afinal de contas, há de um tudo neste mundo.

Os anti-marxistas também precisam ler e entender para se libertarem da orelha de sua obra. Mas não é fácil achar motivação para se gastar tempo desproporcional na vida e se dedicar a tal tarefa. Assim como é preciso maturidade intelectual para apreciar na divergência, é preciso ser um pouco “deadpan” para se especializar na detração. É melhor, ou pelo menos mais prático, saber o suficiente para agitar a ignorância como o estandarte do irrelevante e não como um sinal de fraqueza.

Já que estamos conversando sobre isso: é ou não é uma experiência deslumbrante entrar em uma biblioteca ou uma livraria? Que charme não é uma estante repleta de livros de capa dura -- tanto que um desembargador, cujo nome no momento me falha a memória, tinha uma estante fajuta, que caiu em uma sessão virtual.

Acontece que tais lugares são tão fascinantes quanto esmagadores. Eles humilham a limitação humana; a fração do possível no promontório bibliográfico é quase zero. O que se pode é parcelar no crédito um projeto à guisa de ilusão ou uma ilusão à guisa de projeto – ou então a prateleira de araque desmorona em cima de você.

Jornal de Brasília - 23/2/2022

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