Ivaldo Lemos Júnior
Procurador de Justiça do MPDFT
Por que tudo é controvertido no mundo do direito? Por que opiniões entre eméritos juristas se permitem ser tão díspares e até opostas, mesmo em assuntos os mais simples e banais?
Em primeiro lugar, isso não é apanágio exclusivo do direito, mas das ciências humanas em geral e até das que prometem mais precisão, como as biológicas. E todas passam por flutuações geracionais, marcadas por modas que penduram suas contas nas araras da história. Somos todos reféns involuntários do que o mundo real tem de ruim a credenciar, da Queda de Adão à bomba atômica, da peste bubônica à linguagem neutra.
Responder às perguntas do primeiro parágrafo à guisa de que “o direito é uma ciência humana” não é responder coisa nenhuma. É apenas contornar a questão. É o mesmo que dizer que “2 + 2 = 4”, o que é obviamente correto, mas 4 não é 2 + 2, pois também pode ser 1 + 1 + 2, ou 573 – 569, ou 272/68 e por aí vai sem fim.
O direito é uma combinação de três elementos, fato, valor e norma, que não são fatores aritméticos e sim ingredientes de uma receita que somente pode ser revertida em termos intelectuais. Isso foi tentado por escolas que enfatizaram cada aspecto em detrimento dos demais – positivismo, naturalismo e realismo, e suas próprias subdivisões –, mas sem evitar que os passarinhos comessem os miolos de pão que sinalizavam o caminho de volta.
E o pior vem agora: se a fixação conceitual de cada vértice do triângulo jurídico já não fosse uma encrenca didática terrível, as soluções concretas da experiência pedem que cada um dê a palavra final em caso de tensão entre os dois restantes. Choque entre fato e valor é resolvido pela norma; choque entre fato e norma é resolvido pelo valor; choque entre valor e norma é resolvido pelo fato. E aqui você vê que um 4 com potencial de resultado infinito nem sempre fecha a conta 2 + 2. Taí a resposta.
Jornal de Brasília - 19/4/2023
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