Ivaldo Lemos Júnior
Procurador de Justiça do MPDFT
O professor de anatomia Raymond Dart era australiano e se mudou para a África do Sul com a mulher, Dora. Em 1924, ele recebeu um fóssil de uma mina de calcário no mesmo dia de um casamento, que ocorreria em sua própria residência, e do qual era o padrinho. Dart estava tão concentrado no material que acabou se esquecendo do compromisso. Sabe-se, ou diz a lenda, que foi chamado, participou e depois voltou ao trabalho.
É fácil imaginar que estivesse distraído durante a solenidade, lutando para demonstrar atenção e felicidade pelos noivos, mas ansioso para voltar ao que realmente o atraía naquele momento. O que não é tão fácil é dizer se, antes, o noivo bateu furioso na porta, ou se Dora o fez, com delicadeza, um chazinho, um beijinho, um afago carinhoso na nuca. Esta última versão me agrada mais, por ser bem mais fantasiosa.
Seja como for, Dart publicou artigo científico na respeitada revista Nature, no ano seguinte, defendendo a descoberta de uma nova espécie, que denominou Australopithecus Africanus, e cuja relevância na linha evolutiva é ainda hoje objeto de dúvida. A própria ideia de evolução é duvidosa.
Em 1931, ele foi convidado a participar de um congresso em Londres e falou após uma apresentação esplêndida, com fotos e mapas dos achados do Homem de Pequim na gruta de Choukoutien. Dart só tinha o seu crânio e nada além do que havia dito seis anos atrás. Na sua própria avaliação, fiascou. Colegas o levaram para jantar e Dora voltou para o hotel. E sabe o que aconteceu? Ela esqueceu o crânio no banco do táxi.
Não sei se os episódios do padrinho e do táxi foram motivo de risadas ou, ao contrário, se foram decisivos para o divórcio do casal. Fato é que isso aconteceu mas Raymond não demorou para se recasar, o que fez, aos 41, com Marjorie, uma bibliotecária 13 anos mais jovem. Essas bibliotecárias jovens são um perigo.
Jornal de Brasília - 26/4/2023
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