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Ivaldo Lemos Junior
Procurador de justiça do MPDFT

Estudar história não é analisar acontecimentos em seus detalhes, como datas, logradouros, personagens, na base formidanda da decoreba. Há algo de importância propedêutica, que aponta para as razões que levaram potências a se transformar em realidades. Um fato só ocorre porque era possível (a menos que estejamos tratando de milagres, que são eventos que arrostam as leis da natureza, ou de eventos tão aleatórios que não encontram explicação racional convincente) e essa viabilidade é fruto de uma série de outras condições mais ou menos notórias ou sutis que se conjugam e se convertem em uma força. Estudar história é, antes de mais nada, entender que força é essa.

Aprendemos no colégio que o Brasil se tornou independente de Portugal em 7 de setembro de 1822, nas margens plácidas do riacho Ipiranga, em São Paulo, e todos os anos o dia é relembrado porque é feriado nacional. Aqui na Capital acontecem eventos cívicos, com a presença do Presidente da República e de altos dignitários estatais, enquanto aviões soltam fumaça no ar em acrobacias fabulosas. Mas o 7.9 é um elemento afetivo de coesão política, semi-inventado e entranhado no imaginário popular tanto quanto o óleo entranhou sobre a tela de Pedro Américo.

O quadro mostra o país de então, primitivo, inocente, com uma tapera à direita e um horizonte tão profundo quanto o anil do céu. À esquerda, um tangerino descalço, o peito seminu, transportando toras, é o vidente da cena em que outro Pedro, em um cavalo baio, levanta uma espada e brada três palavras, como se o conjunto do movimento gozasse de propriedades mágicas. Pedro é emulado pelos altos dignitários estatais que o acompanham, e os desfiles de Brasília emulam tudo isso, sem as palavras, só com cavalos e espadas. Não havia aviões em 1822. Mas, no futuro do pretérito, ainda existem taperas e almocreves esfarrapados.

Jornal de Brasília - 6/9/2023

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