Ivaldo Lemos Junior
Procurador de justiça do MPDFT

Quem conhece o filme O iluminado, de Kubrick, sabe que ele se passa em um hotel chamado Overlook. Pois observem as camadas de realidade e ficção que se justapõem na seguinte pergunta: o hotel existia ou não?

Antes de mais nada, o roteiro se baseia em uma novela de mesmo título, de Stephen King. O autor se hospedou no hotel Stanley, que tinha fama de ser infestado por assombrações. Após eventos estranhos experimentados por si mesmo, “hic et nunc” King decidiu criar sua nova obra.

Se o Stanley inspirou o livro, outro hotel, o Timberline, inspirou o filme. Ambos foram construídos em regiões parecidas (embora distantes) nos EUA. Mas nenhum serviu de locação para as filmagens, salvo uma tomada aérea inicial, em que é o Timberline quede fato aparece. Para as cenas externas, foi erguida em estúdio, na Inglaterra, uma fachada quase idêntica ao Timberline. As internas foram todas gravadas em estúdio, tendo por esteio um terceiro hotel, o Ahwahnee, na Califórnia.

Então os fanáticos por O Iluminado têm variadas oportunidades de entrar em contato o filme de maneira mais intensa, mas nenhuma é totalmente verídica.

Quanto ao enredo, o sujeito é contratado para cuidar do Overlook, que fica fechado por meses, durante a temporada de frio. Ele acaba enlouquecendo e mata o cozinheiro (homicídio) e tenta matar a mulher (feminicídio) e o filho (meninicídio). A maneira mais fácil de se compreender a trama é concordando que o lugar é mal assombrado e o protagonista é um fantasma ou uma espécie de reencarnação dele mesmo.

Mas o labirinto tem outra saída. O sujeito pega o trabalho para ter condições de escrever um livro. As únicas dez palavras que consegue datilografar desmontam a ilusão de que a tarefa requer mais tranquilidade e silêncio do que bagagem e talento -- e que motivação sucumbe diante de dificuldades assustadoras, não o contrário.

Jornal de Brasília - 18/10/2023

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