Ivaldo Lemos Junior
Procurador de justiça do MPDFT
Hitler chegou ao governo em 1933, embora o partido nazista não mostrasse, na ocasião (e em nenhuma outra), desempenho eleitoral maciço, e o pleito estivesse eivado por toneladas de irregularidades. Dez anos antes, o grupo do qual ele fazia parte tentou tomar o poder na marra, no episódio do “Putsch da Cervejaria”, “Putsch de Munique” ou “Putsch de 1923”. Cada uma dessas expressões oferece um dado acerca do que significou o movimento, que só não foi uma tremenda trapalhada porque morreram quase 20 pessoas. Mas serviu como aprendizado importante.
A primeira lição foi essa: por mais que demore, o ideal é chegar lá em cima envernizado pelas urnas. Encerrado o rito de passagem, não importam tanto as tatuagens da campanha, da votação e do escrutínio. As formalidades jurídicas, as fotos oficiais, de preferência em carro aberto e o povão aplaudindo com gritos e bandeirinhas, os termos de posse, essas exterioridades festivas obliteram as promessas de araque, os crimes contra a honra, as negociatas que frutificarão amanhã, se o amanhã vier (por via das dúvidas, magnatas financiam candidatos adversários). Fica mais fácil domesticar o discurso do interesse público, do bem comum, do poder que emana do povo, pelo menos em sua maioria.
Outra vantagem é a chance dourada de se vingar, se o jogo virar. Não deu outra. Na chamada “Noite das Facas Longas”, em 1934, Hitler deu o troco nos traidores do Putsch, como von Kahr e von Schleicher. Outro “von”, o Papen, também se deu mal. Sem ser nazista, ele era o vice de Führer, ficou calado durante o Reich e até foi absolvido em Nuremberg, mas precisou de 3 dias para deixar o Tribunal, porque seria linchado se saísse.
Enquanto esteve preso, por pouco tempo e em uma sala cheia de mordomias, Hitler escreveu um livro, com o qual ficou riquíssimo. Noves fora, foi ótimo. Voltou mais maduro e descansado.
Jornal de Brasília - 31/1/2024
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