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Ivaldo Lemos Junior
Procurador de justiça do MPDFT

Leio em André Prous: “a prática da arqueologia é extremamente complexa, e o arqueólogo depende da colaboração de vários especialistas (biólogos, geomorfólogos, físicos etc.). Ele dispõe apenas de fragmentos da realidade do passado – sobretudo o lixo, e ainda por cima selecionado pelos agentes de degradação natural”.

Se você adaptar essa noção para o mundo da Justiça, verá uma admirável semelhança. A prática forense também é bastante complexa e o profissional precisa da ajuda de expertos variados, em áreas como química, engenharia, contabilidade, quem sabe de modo que não ousará recusar (e.g., teste de DNA).

No cotidiano, o operador lida com “fragmentos da realidade do passado” menos sofisticados. Testemunhos vêm contaminados pelo lixo da falta de atenção, traições mnemônicas, desarticulação verbal, escassez ou excesso de interesses particulares, emoções como medo ou raiva. Cada elemento probatório é um caco de um todo que nunca se fecha por completo e é obliterado por discursos do tipo “especial relevância”, “fé pública” e “presunção juris et de jure”. São miolos de pão jogados nos caminhos da floresta jurídica – e pensar que um diria passarão pelo espectrofotômetro da epistemologia processual e serão chamados de “prova”.

Uma demanda não é um sítio arqueológico, mas a fortuna jurisprudencial o é, sobretudo se engendrada à luz de constituições e leis que viraram nafitalina de biblioteca. O Código Beviláqua fez a ligação entre o direito civil da última geração e o fim da União Ibérica, pelos remotos idos de 1640.

Volto a Prous: “a pesquisa científica não é neutra, mas ideologicamente orientada”; pode haver uma arqueologia “branca”, “indígena”, “histórico-cultural”. Bingo de novo! Se você acha que inteligência artificial vai criar juízes-robô fabricando sentenças no estilo do Silogismo Bárbara, está muito, muito enganado.

Jornal de Brasília - 1º/5/2024

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