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Ivaldo Lemos Junior
Procurador de justiça do MPDFT

Você está em um clube, desses de quadras, churrasqueiras etc. Você não é sócio e sim convidado, pela primeira vez. Lá pelas tantas, uma funcionária te admoesta, diz que está fazendo algo que não devia, como jogar basquete sem camisa ou segurar uma bebida na parte interna do alambrado da piscina. Você desconhecia a proibição e agiu sem maldade. Mas “a lei” já te abordou e te comandou, e você tem pouco tempo para tomar uma decisão, que consiste basicamente nas opções obedecer ou desobedecer.

É verdade que há um degradê entre esse tudo ou nada. Por exemplo, você pode acatar de mau grado, não sem antes protestar que não está fazendo nada de mais ou apontar, olha lá aquele outro sem camisa e você não falou nada. No primeiro caso, você está questionando a razão de ser da norma, isto é, apurando o bem que ela protege (também chamado de “espírito da lei”), que deve ter algo a ver com a modéstia que o ambiente familiar exige. No segundo, está questionando a aplicação na dimensão da igualdade.

O jeito como a funcionária fala com você pode ser determinante. Se chegar com doçura ou de maneira agressiva, o contato encontrará chances dissonantes de ganho daquilo que Ortega y Gasset chamava de “sentimento de submissão a algo”, neste caso, o dever moral de cumprir a lei.

Há uma distância entre a previsão da proibição e sua concretização na vida real, que passa pela estratégia de a moça te chamar de “chegado”, “querido” ou “meu senhor”. Algumas pessoas gostam de ser tratadas cerimoniosamente, outras nem tanto, mas não é óbvia a obtenção de resultados práticos com o uso das interjeições “ei” ou “psiu”, e a submissão mais se inspira pelo desejo de não prejudicar seu anfitrião do que de absorver e jorrar a qualidade intrínseca da regra. A maneira aliviada como a lei acolhe seu próprio sucesso – obrigada pela compreensão – revela isso.

Jornal de Brasília - 26/6/2024

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