Ivaldo Lemos Junior
Procurador de justiça do MPDFT
Não tem jeito. Um dia o filho pede para fazer uma pergunta, que pode ser algo simples de se resolver, como a permissão para abrir um refrigerante ou declinar se você prefere Lionel Messi ou Cristiano Ronaldo. Mas pode pintar uma surpresa desconfortável, como no conto do Artur de Azevedo, em que o menino, na mesa de jantar, entre uma palitada e outra, indaga o que é plebiscito.
Se o pai for do ramo, pode dar uma explicação de acordo com a idade e o nível de profundidade circunstancial (sem descartar o risco de se entusiasmar e derivar a conversa para Código Napoleão, Windscheid X Muther, batalha de Alcácer-Quibir e o sebastianismo, queda dos impérios romanos, do ocidente e do oriente, e o tema mais importante da história: julgamentos do Supremo). Se não souber, o pai receia que o garoto perca o respeito por ele e a mentira talvez seja uma saída desesperadamente necessária. Um “não me lembro” pode funcionar por algum tempo.
Quanto mais culto o pai for, melhor, mais pode ajudar na formação do filho. Mas não há como dominar todas as disciplinas oferecidas pelo colégio. É essa a função da escola: o aperfeiçoamento intelectual dos alunos. O que estes vão lá fazer é aprender análise sintática, tabela periódica e o aparelho digestivo dos invertebrados, dentre outros muitos assuntos que vão alargar e enriquecer seu patrimônio cultural. Mas o chassi já vai pronto.
Os jovens não vão assimilar valores morais, esse é um papel intransferível da família e da igreja (se a família não for de igreja, a conta fica só para ela e boa sorte). A escola tem pouco ou nenhum valor moral para transmitir e, se isso acontecer, é porque as instâncias primárias não funcionaram e ela está preenchendo um espaço de maneira improvisada ou até desviada. A influência que um mestre tem sobre os estudantes não chega nem mesmo na polêmica Messi e Cristiano.
Jornal de Brasília - 11/12/2024
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