Ivaldo Lemos Junior
Procurador de Justiça do MPDFT
O propalado repúdio à mentira, ou fake news como se diz na atualidade (o empréstimo do termo estrangeiro pouco ou nada enriqueceu os nossos falsidade, lorota, cascata, balela, patranha e até mito), não é consubstancial à função do Judiciário, que nunca pretendeu ser o dono da verdade. O motivo é simples: ele age por provocação de partes que têm objetivos específicos quando incoam uma demanda e se defendem.
Se tais escopos inexistirem, usando-se a Justiça como órgão de consulta ou fórum de debate intelectual, a ação não pode se desenvolver à míngua do chamado “interesse de agir”, que é uma das “condições da ação”. O provimento precisa ser útil e necessário para o “bem da vida” disputado, com consequências práticas concretas (os termos entre aspas são bastante técnicos).
Como grande parte das causas é litigiosa, o cenário mais provável é que o autor apresente a sua versão e o réu faça o mesmo, em um jogo de hipóteses que entram em colisão e da qual não deve emergir a realidade “sub specie aeternitatis”. O que a máquina faz é coletar argumentos e evidências e sintetizar tudo em uma decisão fundamentada, que se mostra apodítica na estética, mas que epistemologicamente é a coreografia do “in dubio” e um convite à resignação; os recursos facultativos repescam os convites não aceitos, com severas limitações.
No processo civil, essa dinâmica atende por “verdade formal”. O penal fala em “verdade material”, que nada mais é do que uma maior iniciativa de o juiz inovar na prova, e.g., ouvindo uma testemunha que a Promotoria e a Defesa dispensaram – o que é franca exceção, pois a inércia, e mais, a discrição e o anonimato são atributos profundos da magistratura --, ou os corolários próprios do silêncio e da revelia. Em regra, o Judiciário não é tão pretensioso e se contenta com critérios de rigor lógico, plausibilidade e aceitação.
Jornal de Brasília - 22/1/2025
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