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Fausto Rodrigues de Lima
Promotor de Justiça do MPDFT

O ADVOGADO Alex Smaniotto, ao presenciar uma pessoa "extremamente carente" sendo barrada na entrada do fórum de Vilhena (RO) por usar uma bermuda abaixo dos joelhos, reclamou ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

No dia 12/5 deste ano, o CNJ, órgão responsável pelo controle externo da atividade judicial, em vez de rever essas práticas em todo o país, fez o contrário: intensificou a proibição.

De fato, o conselho vetou a entrada nas dependências judiciárias de pessoas trajando calção, short, bermuda, camiseta regata, minissaia, miniblusa, blusa com "decote acentuado", chapéus e bonés.

Além de barrar os cidadãos que não possuem as peças de roupas requeridas, o CNJ ainda se tornou o "guardião da moralidade" contra a indecência e os maus costumes, com especial atenção às mulheres, proibidas de usar minissaias ou "decotes acentuados". Aliás, já houve casos em que juízes admoestaram a Defensoria Pública porque as roupas "impróprias" de suas estagiárias estariam "extraindo a atenção dos jurisdicionados".

Meses antes, ativistas dos direitos humanos e do movimento de mulheres foram barradas no STJ (Superior Tribunal de Justiça). A segurança alegou que as calças femininas, principalmente as jeans, não eram adequadas no autointitulado "tribunal da cidadania". Homens, só com terno e gravata.

Detalhe: a corte julgava na ocasião se as mulheres brasileiras podiam apanhar de seus parceiros impunemente, sem a interferência obrigatória do Estado ou da sociedade (é compreensível que um país preocupado com a forma de vestir das mulheres ainda vacile em enfrentar a violência doméstica).

É, as roupas femininas ainda causam "frisson" no mundo. Em julho de 2009, um tribunal do Sudão condenou um grupo de mulheres sudanesas a receber 40 chibatadas por usar calças, peça considerada "indecente" pela lei islâmica (as que se declararam culpadas receberam punição menor: dez chicotadas).

Curioso que esses fatos ocorram mais de 500 anos após Joana d'Arc ter sido queimada na fogueira por, entre outras heresias, insistir em usar roupas masculinas.

Enquanto isso, as vestes talares (capas, togas e becas) seguem obrigatórias para juízes e promotores no Distrito Federal, por força de uma norma de 1961. Os recalcitrantes podem ser punidos. A promotora Rose Meire Cyrillo e a juíza Elisabeth Amarante, com feliz percepção, diagnosticaram o efeito de tais adornos: "Esconder o que há de humano em nós e criar uma percepção questionável de respeito, autoridade e sabedoria" ("O Divã nas Salas de Audiência", julho/2009).

Medida bem-vinda foi tentada pelo senador Gerson Camata (PMDB-ES), em outubro de 2008. Ele queria desobrigar servidores e parlamentares do uso de terno e gravata no Congresso Nacional. Justificativa: economizar a energia usada nos aparelhos de ar condicionado e, com isso, ajudar a proteger o meio ambiente.

Sem dúvida, o terno - importado das culturas geladas do Norte - é uma aberração num país tropical como o Brasil. Porém, seria mais republicano que se proibissem esses bagulhos não porque são antiecológicos, mas porque só servem para diferenciar a elite dos cidadãos de chinelos e bermudas nos joelhos.

Percebendo esse "perigo", alguns congressistas adiantaram a dificuldade de a proposta ser aceita: "A minha tendência é aceitar a ideia. O problema é que, no Congresso, todos são chamados de "Excelência" ou "doutor", e o traje despojado não lembra esse status" (deputado Fernando Gabeira, PV-RJ); "Essas pessoas estão acostumadas e compenetradas a um simbolismo de hierarquias e valores que passa pela roupa" (senador Garibaldi Alves, PMDB-RN).

Dito e feito! O Senado Federal rejeitou a proposta por unanimidade. Inconformado, o senador Camata disparou algumas verdades: "A dignidade da Casa não pode dispensar paletó, porque a dignidade do Senado é a das falcatruas, das licitações viciadas e do nepotismo" ("Correio Braziliense", 26/11/08).

Bem se vê que o protesto dos "sans-cullotes", aqueles que não usavam as calças chiques da nobreza francesa, ainda não teve grandes efeitos, mesmo com as cabeças roladas das guilhotinas nos idos de 1793-1794.

Fausto Rodrigues de Lima, 38, é promotor de Justiça do Distrito Federal e coordenador do livro "Violência Doméstica - Vulnerabilidades e Desafios na Intervenção Criminal e Multidisciplinar"

Folha de São Paulo

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