Márcio Vieira de Freitas
Promotor de Justiça Adjunto do MPDFT, em exercício na 1ª Promotoria de Defesa do Consumidor
O Consumidor deve ser ressarcido quando a área do imóvel não corresponder àquela constante do contrato de compra e venda ou promessa de compra e venda de imóveis na planta.
Esse foi o entendimento sufragado no REsp 436.853/STJ, de lavra da em. Ministra Nancy Andrighi, mandando aplicar as normas protetivas do CDC aos negócios jurídicos envolvendo compra e venda de imóveis na planta, em detrimento do regramento constante do artigo 1136 do CCB de 1916, atual artigo 500 e parágrafos, do Código Civil Novo.
Contrariamente ao acima exposto, algumas construtoras de imóveis contém cláusulas em seus contratos de promessa de compra e venda de imóveis na planta, que limitam os direitos dos promitentes-compradores de serem ressarcidos pela diferença entre a área anunciada – e constante do contrato – e a efetivamente entregue, quando essa diferença for igual ou inferior a cinco por cento da área total do imóvel ofertado.
Quem assim o faz age sob o errôneo entendimento de estar amparado nos dispositivos da Lei Civil acima citados, os quais fazem distinção clara entre a venda ad corpus, e ad mesuram, determinando que no primeiro caso, o vendedor está desobrigado de indenizar sempre que a discrepância não ultrapassar os cinco por cento, uma vez que a Lei porta a presunção de que área declinada tem característica meramente enunciativa. Ao contrário, a venda na segunda hipótese – na modalidade ad mesuram – presume-se determinante para a concretização do negócio, e sendo assim, obrigam ao ressarcimento.
No entanto, como já adiantado, tal distinção se aplica apenas às relações jurídicas regidas pelo Código Civil, não quando se tratar de relação de consumo, como a que ocorre entre a construtora e o adquirente do imóvel, que devem obedecer as normas protetivas do Código de Defesa do Consumidor.
Dessa forma, sob o influxo das normas protetivas do Estatuto Consumerista, cláusulas desse jaez não são aceitas, uma vez que colocam em extrema desvantagem os consumidores, sob vários aspectos.
Primeiro porque o artigo 51, inciso I do CDC (Lei 8.078/90), comina sanção de nulidade de pleno direito às cláusulas contratuais que “impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços”.
Depois porque o artigo 18 do citado Código determina que “os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária”.
Por fim, salientamos que as relações de consumo devem sempre pautar-se pela boa-fé, razão pela qual o produto ou serviço entregue pelo fornecedor ao consumidor deve guardar simetria com aquele ofertado.
Pensar diferente é permitir um locupletamento sem causa das grandes construtoras em detrimento de prejuízos ao consumidor, uma vez que a soma de várias pequenas diferenças de áreas de imóveis individualmente considerados, pode gerar um grande ganho final no empreendimento como um todo. Basta imaginar um edifício contendo 40 salas de escritórios, cada qual com uma diferença, a menor, da ordem de cinco por cento. O resultado final será um ganho de 200 metros quadrados em favor da construtora.
Pelo exposto, não há que prevalecer qualquer cláusula limitativa do direito que assiste ao adquirente de imóveis em tais circunstâncias, de buscar, pelas vias adequadas, o ressarcimento ou mesmo o desfazimento do contrato, sempre que a área do imóvel recebido divergir daquela anunciada e contratada, seja qual for a diferença, quando se tratar de de imóveis adquiridos na planta. Considerando-se não não escritas as cláusulas limitativas dessa natureza.
Jornal de Brasília