Luciana Medeiros Costa e Yara Maciel Camelo
Promotoras de Justiça da Promotoria de Defesa da Ordem Urbanística do Distrito Federal
O Direito Urbanístico surge no contexto do atual crescimento urbano intensivo como a normatização concretizadora do preceito constitucional que garante o planejamento urbano sustentável e a função social da propriedade e da cidade, criando regras e impondo limitações de ordem pública relativas ao uso e ocupação do solo, que têm como finalidade resguardar as quatro funções básicas do urbanismo, definidas na Carta de Atenas, quais sejam: habitação, trabalho, circulação e recreação, preservando-se, assim, a qualidade de vida da população como um todo.
Com a pretensão de concretizar o mandamento constitucional, dispôs o Estatuto da Cidade e a Lei Orgânica Distrital, em seus artigos 317, 318 e 325, sobre o Plano Diretor de ordenamento territorial (PDOT), Planos Diretores Locais (PDL) e planejamento urbano, instrumentos legais postos à disposição da sociedade para garantir o desenvolvimento sustentável e planejado da cidade e que tratam do zoneamento.
O zoneamento tem como fim delimitar espacialmente áreas territoriais com o objetivo precípuo de estabelecer regras especiais de ocupação do solo.
Ressalte-se que a Constituição, ao mesmo tempo que garante o direito de propriedade, também dispõe que esta deve cumprir sua função social (Arts. 5º, XXII e XXIII, e 182, §2º, da CF). Ou seja, o direito à propriedade privada é assegurado desde que seu uso não implique danos à coletividade ou descumprimento do ordenamento jurídico, entendido aqui como as normas urbanísticas. Em outras palavras, a propriedade deve respeitar o zoneamento, que são limites negativos aos direitos do proprietário. Dessa forma, corresponde ao interesse coletivo e não ao interesse próprio do dominus, o que não significa que não possa haver harmonização entre um e outro.
Há que se considerar que os critérios a serem utilizados para o zoneamento não podem ser fixados arbitrariamente pela administração pública, uma vez que os princípios inerentes à validade dos atos administrativos devem ser observados, como a legalidade, a publicidade, a moralidade, eficiência e o interesse público.
Uma vez estabelecido o zoneamento, toda e qualquer atividade a ser exercida na região passa a ser vinculada, ou seja, não poderão ser admitidas atividades que contrariem as normas de zoneamento.
Indo de encontro aos princípios constitucionais ora ressaltados, chama a atenção o fato de que a Lei Distrital 1.171/96 possibilita às Administrações Regionais, em seu artigo 6º, a concessão do alvará de funcionamento a título precário, mesmo desatendidas parcialmente as exigências quanto ao zoneamento e atividade pretendida, desde que, obviamente, demonstrado o interesse público.
Os prejuízos causados à ordem urbanística, no caso, são patentes. Eis que, na prática, tais autorizações precárias permitem a violação ao zoneamento local, matéria que só pode ser regrada pelos PDOT e PDL.
Na prática tem-se o caos na cidade, como, por exemplo, escolas, cursinhos e universidades funcionando em áreas residenciais. Tais atividades, além de violarem o zoneamento, são impactantes e trazem consigo o aumento no tráfego de veículos e pedestres, já bastante complicado, problemas de estacionamento (falta de vagas e áreas para tal), desvalorização de imóveis, aumento de furtos, roubos e tráfico de drogas nas proximidades, poluição visual, sonora e a piora da qualidade do ar local.
Os cidadãos são agredidos em seu direito fundamental à qualidade de vida e à dignidade diuturnamente.
Faz-se imprescindível e urgente a mobilização da sociedade para que cobre do Poder Executivo medidas efetivas para solucionar a questão e preservar a qualidade de vida e a saúde dos cidadãos do Distrito Federal, sob pena de o fato efetivamente se consumar.
Jornal de Brasília