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Maria Rosynete de Oliveira Lima
Promotora de Justiça

Não se falará da tuberculose, do Mal de Chagas ou das chamadas doenças tropicais (malária, dengue e tantas outras), sobre as quais se debruçam médicos e cientistas desde há muito tempo. A expressão foi muito usada no século passado, e ainda hoje alguns insistem em usá-la, para tratar um mal que, infelizmente, ainda não foi debelado. Tomada por empréstimo da literatura médica/farmacêutica, serviu para identificar um instrumento processual que foi criado para combater a ilegalidade e o abuso de poder praticado por autoridades públicas – o Mandado de Segurança.

Não se falará da tuberculose, do Mal de Chagas ou das chamadas doenças tropicais (malária, dengue e tantas outras), sobre as quais se debruçam médicos e cientistas desde há muito tempo. A expressão foi muito usada no século passado, e ainda hoje alguns insistem em usá-la, para tratar um mal que, infelizmente, ainda não foi debelado. Tomada por empréstimo da literatura médica/farmacêutica, serviu para identificar um instrumento processual que foi criado para combater a ilegalidade e o abuso de poder praticado por autoridades públicas – o Mandado de Segurança.

Seu primeiro assento foi constitucional, e somente depois foi objeto de lei no ano de 1951. Ocupa hoje nosso texto constitucional de 1988, no capítulo dos direitos e garantias fundamentais, para proteger direito líquido e certo, individual ou coletivo, não amparado por habeas corpus ou habeas data. Durante todos esses anos foi amplamente utilizado, e alguns o tratavam como "panacéia" (remédio para curar todos os males), utilizando-o, inclusive, como meio recursal. Os tribunais começaram a aplacar as propostas mais audaciosas, mas se percebia que o sistema processual não conseguia responder com rapidez às demandas da sociedade.

Vieram as reformas processuais de 1994, 2005, 2006 etc. Novos provimentos sumários foram criados, ou aprimorados, mas o Mandado de Segurança permaneceu intocado.

Com um procedimento simplificado, desprovido de contraditório, exige do autor a prova dos fatos alegados, a fim de que o juiz possa proteger, ainda em liminar, o direito violado ou sob ameaça. A autoridade pública, apontada como coatora, é notificada a prestar informações. Em seguida, cabe ao Ministério Público intervir. Para quê?, indagariam os menos avisados. Para "zelar pelo efetivo respeito dos poderes públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição" e porque cabe a ele a "defesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis" (artigos 127 e 129, II, da Constituição Federal). O caso é julgado, o direito recebe a proteção do Estado-Juiz, que intervém na esfera administrativa para restaurar a ordem jurídica, fazendo prevalecer o direito, individual ou coletivo, no lugar da ilegalidade ou do abuso de direito.

Então, o cidadão comum fica perplexo, sem entender como é que a autoridade, investida do encargo público, pratica ato contrário à lei, violando direito reconhecido no ordenamento jurídico. Trata-se de um grande "mal" que adoece não só os indivíduos, mas todo o tecido social, porque menospreza a ordem jurídica posta e faz prevalecer posições singulares, pessoais, em detrimento da dignidade da pessoa humana, seus direitos, amplamente reconhecidos. Essa é a doença que o remédio heróico procura debelar, atenuar.

O Mandado de Segurança não representa a cura, em sentido amplo, porque apenas os casos que conseguem chegar ao Judiciário, e são apreciados, são resolvidos. A ignorância de direitos e as dificuldades de acesso à Justiça constituem, de um lado, graves empecilhos para a recomposição de inúmeras violações aos direitos, individuais ou coletivos, provocadas por autoridades públicas. Mas, por outro lado, o Estado-Administração pouco ou nada tem feito para diminuir as violações a direitos praticadas, diuturnamente, por seus agentes.

Não é incomum se obter ordem mandamental de correção do ato violador, e, ainda assim, a autoridade pública continuar a praticar o mesmo ato, confiante na inércia dos que sofrem a ilegalidade, ou o abuso de poder, em vez de sanear o seu proceder. A cura é possível? Acredita-se que sim.

Mas ela exigirá mudanças estruturais, que começam no pensar e no agir de cada um, já que todos temos direitos, mas também deveres. O que é público interessa a todos, sem exceção, e não apenas ao grupo de servidores que cumprem expediente na repartição. O Estado-Administração precisa modernizar-se; buscar caminhos e instrumentos aptos ao cumprimento do seu papel; "descobrir" a Constituição Federal como fonte e limite dos Poderes; enxergar o administrado, não como aquele que vem importunar a calmaria do expediente, mas como sujeito de direitos, cobrando-lhe, somente quando preciso, o cumprimento dos seus deveres.

Jornal de Brasília

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