Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT
Desde a infância, talvez aos cinco ou seis anos de idade, eu sabia que seria escritor quando crescesse. Entre os 17 e os 24, tentei abandonar essa idéia, na certeza, todavia, de que estava a verrumar minha verdadeira natureza, e que mais cedo ou mais tarde teria que me acomodar em uma cadeira e escrever livros.
Éramos três irmãos, eu o do meio. A distância, dos dois lados, era de cinco anos, e antes dos oito eu quase não vi meu pai. Por isso e por outras razões eu era um tanto solitário, e cedo desenvolvi maneirismos desagradáveis que me tornaram impopular na escola.
Tive o típico hábito infantil de criar histórias e conversar com pessoas imaginárias, e creio que desde o começo minhas ambições literárias se misturavam a sensações de isolamento e depreciação. Sabia que tinha facilidade com as palavras e a capacidade de tratar de fatos ruins, e sentia que isso criava uma espécie de mundo privado, no qual eu poderia me proteger das frustrações cotidianas.
Os parágrafos acima não são meus, mas de George Orwell, deixados no ensaio "Why I write" ("Porque escrevo"), de 1946. Não são meus, mas os traduzo e os faço meus, com exceção da parte do pai. Já a parte em que ele arrola os quatro grandes motivos que levam uma pessoa a escrever um dia merecerão um artigo a parte.
O que pretendo por ora é agradecer o Jornal de Brasília por publicar este que é o meu 100º artigo, num trabalho que, desde julho de 2007, me ajudou a escapar um pouco das minhas próprias frustrações cotidianas.
Para Orwell, "todos os escritores são vaidosos, egoístas e preguiçosos" -- três defeitos que também acho se aplicam a mim --, e que "bem no fundo de suas razões o que existe é um mistério". Esse mistério nada tem de "geometrico demonstrato", mas tampouco é um desafio impossível de análise. Orwell conseguiu muita coisa, e eu mesmo venho tentando o que posso: enquanto o Jornal de Brasília não me chutar, vou continuar me assanhando por aqui. Não tenho absolutamente nada a perder.
Jornal de Brasília