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Antonio Henrique Graciano Suxberger
Promotor do MPDFT

No último dia 4 de setembro, o Poder Executivo Federal enviou à Câmara dos Deputados um projeto que versa sobre a Lei Geral da Polícia Civil. O projeto, apresentado em plenário e autuado sob o número 1.949, atualmente tramita na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público. Se aprovado, seguirá às Comissões de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado e de Constituição e Justiça e de Cidadania. Por se tratar de iniciativa incluída no esforço do Governo Federal para implementação do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) e do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania - (Pronasci), o Projeto recebeu trâmite prioritário.

Um dos mais patentes problemas no enfrentamento da criminalidade urbana é a dificuldade de coordenação entre os diversos órgãos do aparato estatal. Exemplo perceptível de tal problema é o entorno do Distrito Federal. Em que pesem os esforços isolados de parte a parte, as Polícias, civil e militar, e os próprios Ministérios Públicos deparam-se com dificuldades humanas e logísticas para uma atuação coordenada e, o mais importante, eficiente. Nesse sentido, em boa hora vem à lume um projeto de lei que busque traçar um mínimo de diretrizes gerais para a Polícia Civil em todas as unidades da Federação.

Merece destaque, contudo, no corpo do projeto, disposição que, embora singela, evidencia retrocesso ou mesmo óbice a que se cumpram as tão propaladas missões desse mesmo esforço do Poder Executivo Federal no enfrentamento da criminalidade. Diz o projeto que incumbe "privativamente" ao Delegado de Polícia instaurar e presidir inquéritos policiais, termos circunstanciados e "outros procedimentos legais para a apuração de infração penal ou ato infracional" (art. 26, inciso I).

Enquanto a criminalidade se vale de todos os meios e instrumentos advindos da complexidade do mundo moderno, o Estado caminha com passos lentos em suas respostas. A criminalidade transnacional desvergonhadamente estende seu dedo pela mão do jovem desempregado que oferece um DVD "pirata" na rua; a criminalidade de colarinho branco a cada momento cria mais amarras a inviabilizar, por exemplo, a coibição da sonegação fiscal; a corrupção alardeada de órgãos públicos aos poucos já não causa indignação, para se tornar lugar comum de uma suposta cultura tupiniquim. Dissociado desse contexto, o Projeto ignora a relevante atuação de órgãos como o Coaf, a CVM, as auditorias públicas, as investigações levadas a efeito diretamente pelo Ministério Público, enfim, todos os meios de investigação preliminar que se realizam fora da Polícia, mas que ainda assim se prestam efetivamente a bem lastrear ações penais.

Não se discute a relevante atuação da Polícia: aliás, seguramente a maior parte das investigações preliminares realizadas no Brasil é conduzida pela Polícia Civil e, por conseguinte, de incumbência da autoridade policial. Porém, daí a afirmar que toda e qualquer investigação de cunho penal só se realiza dentro da Polícia Civil ou sob a condução do delegado de Polícia vai uma distância muito grande: fruto apenas de uma obtusa e anacrônica visão de persecução penal (dissociada, repita-se, da própria experiência noticiada de todos os países exitosos no tratamento da segurança pública) ou então de uma peleja corporativa, que, seja lá qual for seu resultado, só tem como prejudicado o cidadão.

É triste a percepção de que, enquanto temas tão relevantes quanto a investigação preliminar à persecução penal em juízo forem tratados como se mera ocupação de espaços políticos fossem, será difícil vislumbrar num horizonte próximo avanço em temas como a segurança pública. Mais triste é perceber que, quando o Poder Executivo Federal anuncia suas medidas para atender aos legítimos e prementes reclamos da população, o faz de modo a consagrar em suas ações o reflexo de uma discussão que a ninguém aproveita. Se o projeto mencionado efetivamente veicula preocupação com a modernização e o aperfeiçoamento do sistema jurídico criminal brasileiro, impõe-se que no mínimo traga posições que tenham sido objeto de discussões e debates às claras, bem assim que tenha por mirada não a ocupação de supostos nichos de Poder, mas a atenção maior a um aprimoramento do aparato estatal persecutório. Afinal, a quem interessa tornar a investigação preliminar, preparatória à persecução penal, um verdadeiro "feudo" intocável ou mesmo um espaço entregue com exclusividade ao braço executivo do Estado?

Jornal de Brasília

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