Seu navegador nao suporta javascript, mas isso nao afetara sua navegacao nesta pagina MPDFT - Recursos do SUS e planos de saúde — ressarcimento

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Cátia Gisele Martins Vergara - Promotora de justiça titular da 2ª Prosus/MPDFT
Claúdia Fernanda de Oliveira Pereira - Procuradora-geral do MPC/DF
Lígia dos Reis - Promotora de justiça adjunta, respondendo pela 2ª Prosus/MPDFT

As despesas realizadas, no DF, com recursos públicos para atendimento de beneficiários de planos de saúde, devem gerar o ressarcimento ao SUS pelas respectivas operadoras, quanto aos procedimentos cobertos contratualmente, conforme previsto na Lei Orgânica do Distrito Federal, autêntica Constituição material local, nos parágrafos 1º e 2º do artigo 216. A regra, se aplicada concretamente, impediria o enriquecimento das operadoras de saúde às expensas da rede pública de saúde.


Na Câmara Legislativa do DF (CLDF), tramita o PL 1096/04, de autoria do deputado distrital Chico Leite, prevendo a obrigatoriedade do aludido ressarcimento em 15 dias, pena de inscrição na dívida ativa. Nas suas justificativas, são apontados outros dois projetos que tramitaram na CLDF, os quais foram, todavia, arquivados. A despeito disso, no Rio de Janeiro vigora semelhante previsão desde março de 2003 (Lei 4084/03).

Na esfera federal, a Lei 9.656/98, no seu artigo 32, também obriga o ressarcimento por tais empresas, em razão dos serviços de atendimento à saúde previstos nos respectivos contratos, prestados a seus consumidores e dependentes, em instituições públicas ou privadas, conveniadas ou contratadas, integrantes do Sistema Único de Saúde (SUS). Em 2000, a ANS editou a Resolução RDC nº 18/00, prevendo que o ressarcimento deve ser procedido por meio da Tabela Única Nacional de Equivalência de Procedimentos (Tunep), com o fim de uniformizar as unidades de cobrança em todo o território nacional.

A Lei 9.656/98 foi alvo da Ação Direta de Inconstitucionalidade 1931 junto ao Supremo Tribunal Federal, sendo que, em 2003, ao ser apreciado pedido de liminar, o STF considerou inconstitucionais, sob o aspecto formal, vários artigos, os quais deveriam comportar tratamento por meio de lei complementar. Mas, não, o artigo 32 citado. O relator da ação, ministro Marco Aurélio, não viu qualquer inconstitucionalidade, sublinhando que é matéria “da maior sensibilidade social”, além de qualificar de “anômala” a condição, anterior à norma, em que os agentes operavam nesse mercado sem obrigação de ressarcimento.

Por seu turno, a 6ª. Turma Especializada do Tribunal Regional da 2ª. Região tem entendimento semelhante, pois negou pedido de Seguradora de Saúde que argumentava a inconstitucionalidade desse mesmo diploma (2002.51.01.002613-2). Na ação ajuizada no TRF, refutou-se, ainda, o argumento de que a Tunep, criada pelo Conselho de Saúde Suplementar para fixar o montante a ser ressarcido pelos planos de saúde, conteria valores irreais. Segundo aquela corte, a norma impugnada impede o enriquecimento da empresa que acaba recebendo um aumento patrimonial injustificado, pois deixa de contabilizar o custo financeiro da operação, quando não cumpre o compromisso estabelecido contratualmente. Ademais, a Tunep é resultado de um processo participativo, que se constitui em uma tabela de valores para pagamento por procedimentos realizados, garantindo que esses sejam sempre maiores que a Tabela SUS e menores que os valores praticados no mercado. A última atualização dos valores da Tunep consta na RN 131/ANS, de 2006.

Como esse, há outros precedentes semelhantes em vários tribunais. No entanto, a ausência de um julgamento definitivo no STF é apontada como a causa principal para que a ANS não consiga, na prática, fazer valer a norma, contribuindo para elevar o número de medidas liminares e inviabilizando, dessa forma, os processos de cobrança e gerando incerteza jurídica.

Segundo o médico e professor José Pinotti, em artigo publicado no Jornal Folha de S. Paulo, de 31/7/06, “os planos de saúde dão calote no SUS”, deixando de ser cobrado dois terços do devido ao não computar no ressarcimento todo o uso dos serviços de alto custo, inclusive ambulatorial (quimioterapia, diálise, ressonância, etc.), como determina a Lei 9.656/98. Ademais, apenas 5,9% do cobrado são, de fato, ressarcidos. O que se deixa de recolher equivale a tudo o que se gasta com saúde em São Paulo ou é o dobro do que a EC 29 acrescenta anualmente à saúde.

Tais dados são confirmados no Acórdão 1.146/2006 do Tribunal de Contas da União. Assinala-se que o valor registrado no Siafi, na unidade gestora do Fundo Nacional de Saúde, em 2004, referente à arrecadação proveniente do Ressarcimento por Operadoras de Seguros Privados de Assistência à Saúde (conta 4.1.9.2.2.05.00) foi de apenas R$ 4.955.316,25. Por seu turno, a cobrança restrita apenas aos casos de urgência e emergência, quando, na realidade, deveria ocorrer o ressarcimento em razão da prestação de qualquer serviço, redundou em “uma vultosa redução nos ressarcimentos aos cofres do SUS, uma vez que o valor destes, no período compreendido entre janeiro de 2000 e julho de 2004, deveria montar R$ 1 bilhão, em vez de R$ 51.795.723,19 efetivamente ressarcidos.

O assunto é, como se vê, antigo, porque a discussão da constitucionalidade da norma, que é de 1998, vai completar uma década, mas é, ao mesmo tempo, atual. Em tempos de debate sobre os percentuais devidos para custear a saúde pública e a regulamentação da EC 29/00, seria de se invocar por que não são implementadas medidas concretas a fim de que tão relevante previsão legal seja de uma vez por todas posta em prática, inclusive no DF. Não é justo, nem moral, que os planos de saúde recebam recursos do consumidor e ainda por cima deixem de ressarcir o SUS quando esses serviços forem prestados pelos hospitais públicos. Assim, urge que sejam adotadas medidas concretas para a solução desse problema que impacta negativamente as contas do SUS e acaba por diminuir sobremaneira a prestação de ações e serviços de saúde pelo próprio Estado, em prejuízo daqueles que não têm condições financeiras de arcar com um plano de saúde.

Correio Braziliense

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