Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT
No início do curso de direito aprende-se um brocardo (ditado) em latim que diz "ubi societas, ibi jus". Traduzindo, onde há sociedade, há direito.
Convenhamos, nada mal. Um cartão de visitas e tanto para um estudante novato. É muito animador saber que o direito está em toda a parte e em todos os tempos. Basta que haja sociedade que ele automaticamente aparece. Estamos na profissão certa; desse jeito, totalmente desempregados é difícil ficarmos.
Mas o brocardo tem lá os seus problemas. Ele fala menos do que deveria -- o que aliás não chega a ser um defeito, porque do contrário não seria um brocardo. Este apenas cristaliza em poucas palavras uma ideia consistente, um conhecimento que se consolidou com o tempo e é facilmente transferível, inclusive pelo senso comum, ou seja, por pessoas simples e pouco instruídas mas nem por isso pouco sábias.
Mas isso tampouco garante que o conteúdo de um provérbio seja necessariamente verdadeiro. Aqui sim reside o maior de seus problemas: talvez os levemos a sério demais. Talvez não devamos levar aquelas quatro palavras mágicas (ubi societas ibi jus) no bolso por muito tempo, a menos que o desenvolvimento dos estudos expresse com mais exatidão o que se entende por "societas" e o que precisamente signifique "jus". E isso não cabe em um brocardo, nem mesmo num artigo, nem num livro, e sim em uma biblioteca inteira, uma biblioteca gigantesca que ninguém conseguirá ler toda.
Não se trata de tarefa para o prelúdio do contato com a Jurisprudência, mas de um compromisso de vida, uma vontade de conhecer que é em parte perfeitamente previsível e em parte totalmente inviável. Parafraseando Julián Marías, é uma espécie de "impossível necessário".
Quer uma prova? Falam que não há direito na ilha de Robinson Crusoe porque este vive sozinho. Mas esse exemplo é fajuto, porque a ilha, a pessoa, o enredo, tudo é fictício. Uma hipótese de antemão sabida como falsa não pode sustentar uma teoria, muito menos funcionar como sua prova.
Jornal de Brasília