Seu navegador nao suporta javascript, mas isso nao afetara sua navegacao nesta pagina MPDFT - Retaliação ao Ministério Público - um atentado à sociedade brasileira

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Inácio Pereira Neves Filho
Promotor de Justiça do MPDFT

 Os recentes escândalos protagonizados nos ministérios dos transportes, turismo e agricultura, além de derrubar os ministros respectivos, resultaram na prisão de quase uma centena de pessoas, várias delas integrantes do alto escalão do governo federal, acusadas de desvio de milhões de reais dos cofres públicos. Alguns parlamentares acusaram a Polícia Federal, o Ministério Público e o Judiciário de atuarem com abuso de autoridade quando das prisões. Apesar da gravidade dos fatos divulgados, em nenhum momento esses políticos demonstraram indignação com os escândalos - numa total inversão de valores.

"Coincidentemente", poucos dias após as prisões, o Sen. Humberto Costa (PT/PE) apresentou a Proposta de Emenda à Constituição nº 75/2011, a qual estabelece a aplicação da pena de demissão dos membros do MP por decisão administrativa do Conselho Nacional do Ministério Público - órgão de controle externo do MP, composto por cidadãos indicados pelo Senado e pela Câmara dos Deputados, advogados e juízes, além de membros do MPU e do MP dos Estados.

A questão não chamaria tanto a atenção não fosse o que está detrás de tão nefasta proposta. Ora, a Constituição Federal atual muito bem disciplina sobre a demissão de membro do Ministério Público, estabelecendo que a perda do cargo ocorre após sentença judicial transitada em julgado - a chamada vitaliciedade (art. 128, par. 5º, I, "a"). Essa garantia da vitaliciedade visa proteger a independência do promotor e do juiz no exercício de suas funções, em defesa dos direitos da sociedade, evitando-se que tais autoridades venham a ser alvo de perseguições políticas arbitrárias que possam resultar em suas demissões sumárias do serviço público.

De fato, não raras vezes, a atuação firme do promotor de justiça acaba por contrariar interesses de grupos políticos e econômicos envolvidos em escândalos de desvio de dinheiro público e outras modalidades de corrupção que assolam o país.

Essa proposta de emenda constitucional se apresenta com aparente intuito "moralizador" e "anticorporativista", passando a impressão de abolir um suposto privilégio assegurado aos promotores de só serem demitidos por decisão judicial. O argumento "moralizador" seria a necessidade de aplicação mais ágil da pena de demissão aos membros do MP acusados de desvios de conduta. Contudo, mesmo o cidadão leigo consegue perceber o caráter simulatório embutido na infeliz proposta de emenda: busca, acima de tudo, intimidar o promotor em sua atuação. Em palavras diretas: por receio de ser sumariamente demitido pelo CNMP o promotor não atuaria com independência quando da investigação dos grandes desmandos de corrupção envolvendo políticos. Isso é o que verdadeiramente está encoberto na proposta do senador pernambucano e que com certeza interessa aos políticos corruptos.

Enfim, a PEC 75 pretende calar o ministério público e a sociedade brasileira exatamente no momento em que a nação marcha firmemente contra a corrupção, os desmandos e o assalto aos cofres públicos. Nas palavras do jornalista Boris Casoy: "isso é uma vergonha". Sendo aprovada, perderá a sociedade um dos seus mais importantes mecanismos de controle da corrupção, consistente na independência do promotor de justiça em sua atuação.

A questão não é querer estabelecer qualquer privilégio ou deixar de responsabilizar eventual desvio de conduta deste ou daquele promotor de justiça. Como já dito, a lei atual já estabelece procedimento rigoroso de apuração e punição ao membro faltoso, inclusive com o afastamento do cargo e suspensão do salário desde o início da ação de perda do cargo. Foi o que ocorreu recentemente em relação a dois promotores de justiça do DF.

Também não há dúvida de que o CNMP tem exercido papel relevante no controle do efetivo cumprimento dos deveres funcionais dos membros do MP. Todavia, retirar a questão do âmbito do Judiciário para permitir ao Conselho a demissão administrativa do promotor de justiça, afigura-se aspiração ilegítima e incompatível com o atual estado democrático de direito.

Outro não é o propósito da PEC 75: primeiro se permite a demissão direta do promotor pelo CNMP para, em momento posterior, alterar-se a composição deste Conselho, ampliando o número de integrantes indicados, politicamente, pelo Senado e pela Câmara dos Deputados. Resta cristalino, portanto, a tentativa de invasão da autonomia do Ministério Público, com a intimidação de seus membros.

De se perceber, portanto, que a PEC 75 não se limita à punição sumária do promotor que descumprir seus deveres e obrigações constitucionais. Mais do que isso, permite a demissão arbitrária do promotor que estiver "incomodando" os governantes e políticos inescrupulosos e corruptos.

Essa ardilosa e nefasta proposta de alteração legislativa é atentatória aos princípios da moralidade e independência dos órgãos de controle da administração pública brasileira. Urge que toda a sociedade se conscientize da gravidade do propósito intimidatório - embora velado - contido na PEC 75. A omissão da opinião pública pode constituir em irreparável comprometimento da ainda frágil democracia brasileira.

Diário da Manhã/GO

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