Para Aristóteles, retórica, ou arte da persuasão, é composta por três elementos: a pessoa do orador, os fatos em si e o conteúdo dos argumentos. No ambiente profissional que escolhi para viver, o dom da oratória é muito valorizado. A ideia de um grande advogado está associada à de um emérito tribuno, que encanta plateias pela força das palavras que brotam de convicções e sentimentos genuínos, mais do que pelo desempenho do dever de ofício forjado por um reles contrato de honorários.
É claro que a atividade advocatícia pode ser vista de maneira invertida, que é rasteira, até arcana: a do sujeito picareta, que topa aplicar golpes baixos para vencer a causa, ou que engana o próprio cliente. Não posso dizer que não aconteça, ou que seja uma boa desculpa, mas a hipótese não é apanágio dos advogados. Contadores, psiquiatras, escritores e até jogadores de futebol podem ser vistos às suas maneiras como enganadores, ainda que sejam famosos e bem sucedidos.
O desmascaramento de prestidigitadores passa pelo mesmo crivo da apreensão da realidade em seu sentido paradigmático: aquilo que se pode pegar com as mãos e, de preferência, colocar na boca, dificilmente iludirá muita gente por muito tempo. Nesse viés, profissionais como engenheiros e cozinheiros são menos favorecidos. Uma peça forense redigida por um advogado pode ser considerada brilhante por uns e medíocre por outros - o próprio autor sempre poderá renegá-la e culpar a falta de tempo, a juventude, doença na família, o que quiser. Mas a ponte que o engenheiro construiu é sólida ou não é, e isso pode ser comprovado de modo indiscutível. Nunca ouvi falar que os melhores engenheiros fossem os melhores oradores ipso facto.
Já a figura do orador é componente integrante da persuasão, não da retórica. Advogados não discursam da cátedra trajando moletom ou boné e isso não é à toa. Convém serem velhos distintos que esbanjam experiência, ou senão jovens talentosos que prometem futuro. Um pouco de beleza também não faz nada mal.
Jornal de Brasília