Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT

E quando a pessoa à sua frente está visivelmente nervosa, perturbada com a sua presença? O que fazer: procurar relaxá-la e convidá-la a perceber que você não é "a thing of dark imaginings", como no poema do lorde, ou, ao contrário, tentar dominá-la de vez e tirar o máximo de proveito da situação?

Você vai dizer que depende do contexto, e depende mesmo. Às vezes, o que se precisa não é mais do que informação. O policial precisa de informação, o jornalista e o etnólogo também. Em todos esses casos, o sujeito está trabalhando e a outra pessoa não passa de um instrumento de seu trabalho. Não existe uma relação, digamos, de horizontalidade.

Ainda assim, alguma horizontalidade precisa ser forjada para que a informação desejada seja extraída com sucesso. Um exemplo bobo: uma pessoa que te aborda na rua, em busca de um endereço, precisa agir da maneira apropriada. Se for arrogante ou deselegante, dificilmente despertará o interesse em ser atendida, ou com o volume de detalhamento de que realmente precisa. Quem sabe o interlocutor se sentirá tentado a dar uma orientação falsa de propósito, em um momento de vingança que julgou merecida, para compensar o incômodo sofrido, para punir o chato que lhe atravessou a vida.

Embora a testemunha seja juridicamente obrigada a responder - e com toda a honestidade possível - as perguntas do policial ou do juiz, ela pode não fazê-lo. Pode deixar de revelar uma questão relevante, ou apelar para ignorância ou esquecimento. Existem técnicas para se obter depoimentos ricos em conteúdo, e todas passam por um mínimo de empatia e confiança. Tem a ver com firmeza, objetividade, credibilidade e outros ingredientes, dentre os quais não se inclui o medo puro e simples.

Afinal, conseguir na marra o que se pretende é o que o direito penal vai chamar de "crime". Essa é a essência do roubo, da extorsão, do estupro, do aborto, do homicídio, da tortura, do abuso de autoridade, da calúnia. Todo crime é uma usurpação, e toda usurpação é um crime.

Jornal de Brasília