Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT
No capítulo de 14.8.2012 de “Gabriela”, o coronel Ramiro Bastos assoma à igreja no momento do casamento entre S. Nacib e Gabriela. O padre, uma figura domesticada por Jorge Amado ou pela minissérie (não sei) como hipócrita e efeminada, indaga se há algum problema, e a resposta é não, pelo contrário, ele fazia era gosto naquele enlace. Então a cerimônia prossegue normalmente.
No relance, parece que a união só se aperfeiçoaria com o consentimento do coronel. Tudo indica que surgiria um impasse se o velho fizesse algum sinal desfavorável.
Mas as coisas só haviam chegado àquele ponto por obséquio da Dona Dorotéia. Esta, quando foi ter com Gabriela, estava disposta a expulsá-la da cidade, em razão do contubérnio ilícito com seu noivo, da irresignação diante do fato, aparentemente um problema somente particular – ou, para Gabriela, problema nenhum --, de que Nacib havia derrubado a parede que dividia o quarto e a cozinha. Mas D. Dorotéia se encantou com seus dotes culinários e seu charme primitivo, de quem nem sabia com quem estava lidando, e lhe deu uma chance.
Portanto, à luz da “demonstração de intimidação”, quem manda é o coronel. Mas de modo anterior, mais discreto e muito mais decisivo, quem realmente deu as cartas foi a velha. Quando o coronel entrou em cena, o himeneu já estava proclamado, o vestido costurado, o bolo confeitado, a orquestra contratada e a fina flor de Ilhéus convidada. Aliás, só a nata da cidade interessava. Embora o matrimônio católico se preste justamente para legitimar as relações sexuais, ninguém que não pudesse testemunhá-lo dignamente poderia ser convidado. Tanto o defloramento quanto o casamento são ditames da alvenaria cultural; D. Dorotéia é apenas uma pedreira que reconstruiu uma parede demolida.
O coronel também. Mas se ele manifestasse oposição, D. Dorotéia protestaria sua homologação, e ele voltaria atrás, num “bobbing” tão patético quanto o do padre.
Jornal de Brasília