Inácio Neves Filho
Promotor de Justiça do MPDFT
Na 1ª e 2ª parte deste ensaio, publicados aos 24 e 25.08.2012, respectivamente, dirigi-me aos profissionais da área da saúde e aos promotores de justiça, oportunidades em que discorri sobre a humanização da atuação desses profissionais, procurando estabelecer a diferença entre inteligência e sabedoria. Afirmei que inteligência é uma palavra que tem se pautado com grande equívoco quando se propõe a definir grau de importância ou de sucesso de alguém, seja na vida pessoal ou profissional, uma vez que, para desempenhar sabiamente qualquer função é necessário, acima de tudo, esforço, dedicação, persistência, motivação e serenidade. Conclui que sabedoria não é sinônimo de erudição, conhecimento filosófico ou científico, mas, a aplicação inteligente da grande soma dos conhecimentos adquiridos. A título de exemplo do que não é sabedoria, cito um comportamento bastante próximo e atual: um promotor de justiça de Brasília, filosófica e juridicamente considerado culto, está indignado com a condenação do todo poderoso José Dirceu na quadrilha do mensalão. Eu pergunto: o cidadão comum, em plena e sã consciência, tem dúvida de que o bando que está sendo julgado pelo STF associou-se, em em quadrilha, para assaltar os cofres públicos?
Pois bem. As duas abordagens, a meu ver, são pertinentes e suficientes para externar a visão que tenho sobre a importância da aplicação inteligente de nossos conhecimentos em prol de uma vivência mais rica e intensa, não só profissional, mas principalmente em nossa vida pessoal, contribuindo para melhorar o bem estar de todos. Mas, a consciência da limitação que tenho sobre o tema que me propus abordar, e o respeito ao assíduo leitor, me faz abreviar o assunto, encerrando-o aqui com uma pequena alteração no título, já que “bodas que valem ouro” nada mais é que uma reflexão sobre a vida de um casal que, em 50 anos de convivência, puseram em prática uma filosofia de vida que pode ser traduzida em verdadeira “sabedoria essencial”.
Torna-se necessário, inicialmente, um esclarecimento sobre o que vem a ser “bodas de ouro”. Poucas pessoas conhecem a origem etimológica da palavra boda. Ela provém do latim votum, que significa promessa. Desta forma, quando se diz "minha boda" estamos dizendo "minha promessa". De acordo com o seu significado religioso, sem dúvida, é a promessa, por excelência, que um homem e uma mulher podem fazer diante de Deus, realizando seu compromisso de esposo e esposa diante de um altar consagrado. Uma promessa para toda a vida, e esse é o ditame de seu ritual. Por isso, esse momento tão especial deverá ser comemorado em toda sua magnitude, unido a cada um dos elementos que contribuem para que essa promessa tenha a força simbólica que merece.
Uma lenda atribui uma falsa etimologia a que na antiga Judéia tinha-se o costume de matar um cabrito para o churrasco nas comemorações de casamento ou aniversário de casamento. Com o tempo, o cabrito foi substituído pela fêmea do bode, a "boda", cuja carne era muito mais macia. Matar a "boda" era sinal de que haveria festa. Devido a isto o nome "boda" passou a ser sinônimo de festa, hoje em dia mais falada para casamentos. Boda (pronuncia-se "bôda") é a festa que celebra o aniversário de casamento. No Brasil é costume dizer bodas, no plural. As bodas de prata e de ouro são as mais conhecidas e comemoradas.
É tradicional, na cultura ocidental, comemorarem-se com bodas os eventos relativos ao casamento, e com o jubileu, outros fatos marcantes da vida social. Esta tradição vem da Alemanha, onde era costume que um povoado oferecesse uma coroa de prata aos casais que fizessem 25 anos de casados, e uma de ouro aos que chegassem aos 50. Com o passar do tempo, o número de símbolos aumentaram e a tradição expandiu-se pelo resto do mundo. Para cada aniversário, os obséquios eram de materiais diferentes, que iam dos mais frágeis aos mais fortes, conforme a progressão do número de anos, o que simbolizava o aumento da resistência da relação. Na joalheria, tradicionalmente são produzidas as alianças de bodas de prata e de ouro. Para as demais, geralmente são confeccionados anéis utilizando-se os materiais ou a pedra correspondente.
Embora a maioria das pessoas só conheça as bodas de prata e de ouro, a cultura popular associou um material para cada aniversário de casamento, independentemente dos anéis, que representa uma nova etapa de vida. A lista varia desde as bodas de papel, do primeiro ano de casamento, às de estanho para 10 anos, prata, 25, esmeralda, 40 e ouro, 50. O ouro fascina a humanidade desde a sua descoberta: de todos os metais, apenas ele reúne beleza, brilho, virtual indestrutibilidade e maleabilidade. Da palavra grega "adamas", que significa força e eternidade do amor, surgiu a denominação diamante, comemorativo de 60 anos. Existe, ainda, brilhante, para 75, até jequitibá, para 100 anos de casados.
No dia 30 de setembro último, meus pais, Inácio Pereira Neves e Eclair Xavier Maciel Neves, fizeram 50 anos de casados, cuja data foi comemorada em grande estilo numa festa para 450 convidados, na residência do casal, em Crixás-GO. O evento contou com a celebração de uma missa pelo Monsenhor José Modesto, seguida de homenagens, apresentação do coral da PUC-GO, jantar e animado baile. Como filho do casal, tenho o orgulho de dizer que o evento foi realmente digno de ser comemorado com os parentes e amigos, pois estas são, sim, “bodas que valem ouro”. A satisfação e emoção não é apenas por terem eles vividos juntos todo esse tempo. Mais do que isso, é pelo exemplo de vida que levam: uma vida pautada pelo trabalho, pela honestidade e, principalmente, pela obediência reta aos valores éticos, morais e espirituais que sempre marcaram a vida do casal. É, realmente, de se admirar como duas pessoas, aparentemente de personalidades tão diferentes, conseguiram formar um patrimônio moral tão invejável, uma raridade nos dias atuais. É impossível descrever, em poucas linhas, as qualidades extraordinárias de meus pais Inácio-Eclair, tanto na formação dos filhos, como na relação com os demais familiares, parentes e amigos.
Penso que na grandiosa festa das bodas Deus cochichou no ouvido de meus pais: “vocês são meus queridos. Um dia vocês nasceram. Tiveram sonhos. Eu mesmo os criei. Coloquei dentro de vocês essa vontade de se amarem. Coloquei em seus corpos germes de vida. O amor se misturou com a fecundidade e vocês geraram filhos e os filhos de vocês lhes deram netos. E a vida passou. Acompanhei passo a passo a história de vocês. Estive presente no momento do sim. Minha força esteve atuante no momento das dificuldades duras da vida. Acompanhei passo a passo a história de vocês. Vi que vocês se associaram à cruz de meu Filho em muitos momentos e vocês perceberam que a cruz foi geradora da paz e de energias novas. Vi o exemplo que vocês deram ao mundo que os cercava. Estive presente no meio de vocês quando golpes duros pareciam fazer estremecer a casa de vocês. Mas tudo estava fundado na rocha firme e a casa não caiu. Hoje recebo o coração de vocês nesse instante das bodas de ouro. Vocês são um sinal claro de mim mesmo no meio do mundo. Vocês viveram o amor e minha casa é a casa do amor."
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Diário da Manhã/GO