A capacidade craniana do Homo Habilis foi calculada em 642 cm3. Esse número parece preciso, “científico”, mas convém frisar que o seguinte: (1) foram utilizadas peças de crânios diferentes para se fazer um só, pelo que o resultado é notoriamente artificial; (2) o processo também foi artificial, pois a escassez de material exigiu que a reconstituição fosse bem criativa, e asmuitas peças faltantes foram substituídas pela imaginação pura e simples.
No reino da humanidade, existem pessoas, processos e produtos, que são relativamente independentes. Vamos lembrar de Beethoven, um indivíduo molambento, que trabalhava em seu apartamento gelado e imundo, mas que compôs uma música limpa e organizada. Quem poderia dizer que, de um chiqueiro, poderiam ter saído as sonatas e sinfonias que o mundo eternizou!
Voltando ao Homo Habilis, já vimos que processo e produto foram forçados. Já a pessoa por trás de tudo, Louis Leakey, era alguém sedento por atingir um objetivo: o de decifrar o ancestral humano mais antigo possível. A oportunidade não era objetivamente ideal, mas ele de forma alguma queria desperdiça-la.
642 cm3 era menos que a capacidade aceita no tempo de Keith e Woodward: 750 cm3. Mas o padrão foi encolhido por Sir Wilfred Le Gros Clark para 700 (com ressalvas que merecem ser comentadas futuramente) e, de qualquer modo, era 200 cm3 maior do que a média dos australopitecinos gráceis.
Se o Homo Habilis fosse uma possibilidade aceitável, ele teria que ser classificado como um macaco grande e evoluído ou como um humano pequeno e primitivo. Ora, essa decisão já estava tomada de antemão por Leakey, não obstante a fragilidade das evidências e a relutância de seus colegas. O resultado é que, até hoje, muitos não aceitam a validade de sua obra, muito menos a sua importância.
Jornal de Brasília