Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT
Karl Popper chamava de “paradigma do real” qualquer objeto que “um bebê possa segurar e, de preferência, colocar na boca”. O termo “real” é a partir daí expandido para coisas grandes e diminuído para pequenas. Tais variações são imediatas; não é necessário se apelar para equipamentos de precisão. Por exemplo, um pedaço usual de pizza pode bem caber em uma mão, mas não abocanhado de uma só vez, e sim aos pedaços. Mas é claro que um pedaço de um pedaço de pizza é um pedaço de pizza.
O paradigma de Popper, por antonomásia, é o seio materno, ou melhor, o mamilo. Podem se submeter aos sentidos do tato e do olfato, da degustação, várias outras partes do corpo humano. Este também pode ser objeto de estudo, e diversas disciplinas o fazem de acordo com seus escopos domésticos: odontologia e genética, antropologia e nutrição, todos os ramos da medicina. Pode, outrossim, ser vítima de vilipêndio, de atos atentatórios à dignidade consolidada, e por isso são trazidos para fora dos ambientes particulares, e tratados à guisa de crimes: homicídio, estupro etc.
Mas você pode ver o organismo humano não como uma coisa mais ou menos manipulável, e sim como um processo, um processo natural. Nesse caso, ele é uma designação metafórica – senão um símbolo -, que segue seu próprio rumo inevitável, sob o aspecto de transformações diárias visíveis e invisíveis. Doenças, envelhecimento e morte são dados que podem ser controlados ou retardados, mas nunca totalmente evitados. Isso jamais aconteceu ou acontecerá.
Nós sabemos onde os nossos corpos começam e onde terminam, mas nossa capacidade de abstraí-los comunga uma metodologia qualitativamente diferente de adaptação ao meio ambiente, que é física apenas preliminarmente, e se aperfeiçoa em um sentido de reação, de recuo, de ocultamento.
Jornal de Brasilia - 11/2/2013