Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT
Ortega y Gasset recusava a divisão da sociedade em classes, ao menos da maneira como estamos acostumados, que é pelo critério financeiro ou econômico. A verdadeira divisão se dá em classes de homens e sociais ou, como prefere, entre "minorias" e "massa s". Ele mesmo o explica: "As minorias são indivíduos ou grupos de indivíduos especialmente qualificados. A massa é o conjunto de pessoas não especialmente qualificadas".
Ortega aponta para a necessidade imperiosa de se ser um aristocrata e, mais uma vez, essa palavra não corresponde ao estigma cravado pelo vulgo, que é inspirado por razões monetárias. Aristocrata não seria uma pessoa endinheirada e, provavelmente, arrogante, insensível, abominável, mas alguém que se esforça para se separar da multidão, que rechaça ser um indivíduo. Cada galinha dentro de um galinheiro é um indivíduo. Cada boi dentro da boiada também. A multidão é a quantidade, e a massa é a qualidade, mas a qualidade do idêntico, do "tipo genérico", do "co - mo todo mundo".
Para as minorias, a própria consciência de pertencer a tal grupo um grupo menor, mas ainda assim um grupo - é uma coincidência posterior e secundária; é "uma coincidência em não coincidir". Em inglês, usa-se a expressão "gentle man ". Em português, não costumamos falar "gentil homem", que soa como uma tradução afetada.
Voltarei a essas reflexões outras vezes. Por ora, quero aplicá-las brevemente ao direito, ao relembrar a diferença que faz quando se leva a sério ou na ironia o significado de palavras como "jurista " e "doutri - nador". Para o meu gosto, ninguém que não conheça de cabo a rabo "A Re pú bli ca", de Platão, ou não domine os "Comentários", de Sir William Blackstone, pode ser considerado um jurista. Mas estudar e provar que estudou ainda não faz do homem um gentil-homem.
Jornal de Brasília - 22/4/2013