Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT
Se existe uma coisa na vida que é muito enganosa, essa coisa é a reputação, que é a maneira estereotipada como as pessoas veem os outros. Algumas reputações são positivas: Fulano é engraçado, inteligente, bonito. Outras são negativas: Fulano é desonesto, fofoqueiro, preguiçoso. Algumas são vagas ou dúbias: Fulano é "uma figura" ou Fulano "apronta muito".
Algumas são mistas: é inteligente mas vaidoso, culto mas boçal. Todavia, a reputação não respeita a complexidade do caráter e da personalidade, mas pinça um traço mais marcante, ou dois, no máximo três.
Repito que nem sempre reputação é algo de verdadeiro ou de muito verdadeiro, principalmente se positiva. Não é raro que uma pessoa tenha fama de culta, mas a fama pode ser maior do que a cultura. Considerar uma pessoa culta é subjetivo, mas admitir que uma pessoa seja considerada culta ou muito culta – mesmo que isso seja de uma injustiça monstruosa -- não é. A voz ativa é pessoal. A voz passiva é impessoal. Karl Popper chamava isso, mutatis mutandis, de conhecimento subjetivo e conhecimento objetivo.
Por isso é muito mais fácil destruir do que construir reputação. A construção é um processo longo, difícil e solitário, que pode ou não corresponder à realidade. A destruição é um processo rápido, fácil, tentador. Para mim, futricar e matar são espécies do mesmo gênero destruidor. Futrica é uma espécie de morte.
Se nossas vidas fossem músicas, a reputação seria a letra. A melodia seria quem somos. A letra seria o que somos. Existem muitas músicas sem palavras, em todos os ritmos possíveis. Mas não existe música sem melodia. Música sem melodia se chama poema, barulho, ou alguma outra coisa. Mas música sem letra se chama música, mesmo. A letra agrega valor ou desvalor, mas não modifica a natureza, a substância.
Jornal de Brasília - 26/5/2014