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Ivaldo Lemos Junior 
Promotor de Justiça do MPDFT

Em 16.12.1600, Kepler enviou uma carta a seu antigo mestre Mästlin, queixando-se de problemas de saúde e financeiros. Assim escreveu: “anseio por consolo, pois ainda estou sofrendo de febre intermitente, e de uma perigosa tosse. Suspeito de tuberculose, o que pode me levar à morte. Minha mulher também está doente. Além do mais, pouco restou do dinheiro para a viagem”.

A viagem em questão era para Praga, para onde Kepler se mudara na condição de refugiado, juntamente com sua família (mulher e enteada; eles haviam tido dois filhos, que faleceram). Ele se recusara a se converter ao catolicismo romano, e fora expulso da Estíria do arquiduque Ferdinando, que havia conduzido pessoalmente o processo de confissão religiosa, iniciado em 31 de julho daquele ano, na igreja de Graz.

Muitos luteranos – dentre eles, Jobst Müller, sogro de Kepler – optaram por ficar em sua terra, sob a condição de jurar aliança a Roma e ao Papa. Kepler foi o 15º nome apregoado no dia 2 de agosto. Sua intransigência o levou a ser exonerado do cargo de matemático imperial da Áustria Superior, abandonar a região no prazo de 6 semanas e 3 dias, e pagar um imposto de 10% de seu patrimônio. Ganhou, todavia, uma carta de recomendação. Uma não, duas.

A viagem para Praga, iniciada em 10 de setembro, foi lenta, cansativa, perigosa e cara. Pedir auxílio a Tycho, pessoa com quem tinha relacionamento difícil, só não era um plano menos desesperado do que ir para Itália estudar medicina, o que foi oferecido a Kepler e repudiado. Sua vida estava caindo aos pedaços. “Tenho sofrido demais o peso da escuridão. Estou insatisfeito comigo mesmo”, escreveu, na carta mencionada acima.

Que importância tem tudo isso? Por que um promotor público brasileiro está trazendo à tona essas questões, mais de 400 anos depois?

Jornal de Brasília - 28/7/2014

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