Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT
Em “Judas”, Amós Oz faz um pseudo romance de formação de Shmuel Asch, jovem que vive em Jerusalém no inverno de 1959. O maior problema de Shmuel era a falta daquilo que todo homem precisa ter: um grande amigo e um grande amor. Na infância, ele teve “três ou quatro” amigos, “e todos estavam entre os panacas da turma”; depois, nem isso. Em termos eróticos, Shmuel vivia entre o passado de um amor perdido e o futuro de um amor inviável.
Para piorar, Shmuel estava encrencado em termos estudantis e profissionais. Abandonara os estudos que vinha desenvolvendo e, em dificuldades financeiras, resolveu dar um tempo na casa de um velho, em troca de moradia, alimentação e um pequeno salário. Sua função precípua era ouvir o velho. Talvez ele alimentasse a esperança surda e difusa de que o velho ocupasse em sua vida o lugar que o abade Faria ocupou na vida de Dantès. O velho, contudo, estava mais interessado em um “sparring” do que em um pupilo. Há quem deteste ser contrariado, e há quem goste, mas goste tanto, que chega a discordar de si mesmo quando tudo está calmo demais. Há quem ache que os mínimos problemas são coisas insolúveis, e há quem ache que impasses impossíveis de se resolver não passam de mal entendidos.
Na época do livro, Israel era governado por David Ben Gurion; Shmuel era socialista e não perdoava Ben Gurion por ter abandonado o socialismo na maturidade. Então ele se encantou com algo que estava acontecendo em outra parte do mundo: Cuba. Chegou a por um pôster dos guerrilheiros na parede da água-furtada que habitava. Mas aqui o romance, escrito em 2014, tem uma falha: em1959, arevolução cubana não era declaradamente socialista e muito menos comunista. Declaradamente, era um movimento democrático, de derrubada do governo então vigente, corrupto e ditatorial.
Jornal de Brasília - 23/02/2015