Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT
Quanto existe de humor nas coisas mais sisudas, como um congresso internacional de cientistas (de preferência de disciplinas exatas, em que predominam gráficos e números colacionados em anos de pesquisas e testes) ou o julgamento de um tribunal superior em matéria árida? Costuma-se pensar que nenhum, que brincadeira tem hora. Descontração tem o receio atávico de incompatibilidade com credibilidade. No imaginário popular, Einstein parece que foi o único que conquistou o direito de ser genial e irreverente ao mesmo tempo. Mas aquele primeiro, este depois.
Será que as coisas não melhorariam se percebêssemos que somos todos vítimas da própria obtusidade (em muitos aspectos, Einstein era um homem mais estúpido do que você) e vaidade, e dignos de riso mesmo diante do perigo? E que o verdadeiro humor não consiste em gozação e sim autodepreciação? Queremos inspirar respeito ou medo, não a impressão de que somos bobos que despertam nos outros o sentimento do ridículo. Mas ideias e conceitos, vulgares e sofisticados, são baseados em ironias, em uma “seriedade instável”, como dizia Ortega, que completa: “a razão é um instrumento doméstico que o homem necessita e usa para esclarecer sua situação no meio da infinita e ultraproblemática realidade que é a sua vida. Vida é luta com as coisas para se sustentar no meio delas”.
Afirmar que o Bebê de Taung era um Australopithecus Africanus é uma conclusão gravíssima e uma piada ao mesmo tempo. O fóssil podia não ser o que era, e seu gênero, muito menos. Para mim, Dr. Dart seria o exemplo de cientista se um dia debochasse da própria descoberta e a minimizasse como passatempo de juventude. Dr. Leakey, ao contrário, queria entrar para a história de qualquer jeito, bolando achados e forçando teorias inconsistentes. Ele, sim, era um palhaço.
Jornal de Brasília - 29/6/2015