Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT
No imaginário popular, quem comanda o crime organizado é um sujeito com terno risca-de-giz, charuto na boca e metralhadora que dispara só de olhar. Esse estereótipo pinçou aspectos de algum notório "mafioso" como Capone, Rothstein ou Luciano, e o resultado está longe de corresponder com a vida real.
Uma quadrilha organizada dispõe de um organograma mais ou menos extenso e complexo. Na base existem indivíduos que nem são reconhecidos como integrantes efetivos, fazem parcerias pontuais e só. No jargão trazido por Joe Pistone, esses são os connected guys. Se recebem convite para pertencer formalmente ao grupo, passam à condição de wise guys e crescem na carreira à medida que vão obtendo reconhecimento por seus méritos. Até ocuparem posições mais elevadas, tiveram que ficar muitas vezes do lado de fora de um restaurante, na neve, fazendo a segurança de um figuração que nem sequer os cumprimentou. Fazer estágio na cadeia é também visto com bons olhos.
Pistone afirma uma coisa de arrepiar: é bem maior do que se imagina a chance de um cidadão comum ter tido contato direto com o crime organizado. Nada tão óbvio quanto cassino ou boate de strip tease, mas algo mais inocente como brincar numa máquina de fliperama num bar controlado pelo grupo ou comer um filé oriundo de um assalto. Ou senão transitar por uma rua surpreendentemente segura, porque é ali onde mora um bandido de alto escalão. A atividade precipua do crime organizado não é o assassinato e sim o roubo. Seus membros são na essência ladrões. Ou melhor, latrocidas. Matam, mas se e somente se for necessário.
E o que roubam? Absolutamente qualquer coisa. Não se desperdiça a chance de subtrair um carregamento de papel higiênico. É assim mesmo que a base evolui: com informações quentes e investidas bem sucedidas.
Jornal de Brasília - 21/9/2015