Adolf Hitler era vegetariano. Esse fato chama a atenção, já que ele foi um governante cruel e cruento, responsável pelo ocídio de milhões de seres humanos e, ao mesmo tempo, incapaz de aceitar o sacrifício de bicho para um fim útil, o alimentício. Certo? Bem, se você pesquisar na internet, vai achar diversos sítios garantindo que o Führer não era vegetariano coisa nenhuma; há riqueza de informações nesse sentido, que acabam convencendo ou, pelo menos, confundindo.
Não quero chegar a uma solução final sobre esse ponto, que é, em princípio, uma preferência particular como outra qualquer. O que estou questionando é a natureza do conhecimento e suas fontes, que jorram fatos notórios, muitas vezes de conteúdo duvidoso ou mesmo falso. Se isso vale para um detalhe recente e facilmente verificável, objeto de um consenso viável, imagine o que pensar de assuntos bem mais antigos, intrincados e documentados de maneira infinitamente mais precária e desconfiável.
Outra coisa é o abuso da palavra “nazista” (e mais ainda, “fascista”). Acontece que nazismo foi um regime político muito específico, bem delimitado em sua estrutura histórica (era para ter durado 1000 anos e durou 12), jurídica e estratégica. Para chamar alguém de nazista, é necessário fazer associação com algum ponto relevante do sistema, o maior dos quais, a crença na superioridade de uma raça e a eliminação de todos os que a conspurcam. É golpe baixo pinçar algum aspecto periférico como o vegetarianismo – se é que era o caso de Hitler – ou o apreço pela limpeza imaculada das ruas. Isso lembra o sujeito que se alistou no partido nazista no mesmo dia em que descobriu que, como ele, Hitler odiava tabaco. Aliás, muito mais macabra é a ironia de um anti-tabagista convicto ter transformado inúmeras de suas vítimas em fumaça.
Jornal de Brasília - 4/4/2016
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