O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) reuniu, na manhã desta segunda-feira, artistas, gestores culturais, representantes da Secretaria de Cultura e outros profissionais da área para discutir o princípio da impessoalidade na aplicação dos recursos do Fundo de Apoio à Cultura (FAC). A audiência pública foi aberta pela Vice-Procuradora-Geral de Justiça, Zenaide Souto Martins, para quem o objetivo principal do encontro é "a obtenção de dados sólidos que baseiem a aplicação do ordenamento jurídico".
Para a Promotora Cátia Gisele Vergara, titular da 6ª Promotoria de Defesa do Patrimônio Público (Prodep), o tema é polêmico e a audiência pública é uma boa oportunidade para esclarecer o que é o princípio da impessoalidade e permitir que ele também seja aplicado em relação ao FAC. "Nosso objetivo é evitar favoritismos e permitir igualdade de acesso ao recurso", afirmou.
Em 2009, os recursos do FAC chegaram a 33 milhões de reais. Com o aumento dos valores disponíveis, a gestão do fundo precisou se profissionalizar. A partir de sugestões apresentadas pelo Ministério Público, o processo seletivo passou por modificações, de modo que pudesse atender o critério da impessoalidade. Segundo o promotor Albertino Pereira Neto, "a atividade de fomento deve estar ao alcance de todos os que têm condições de participar".
O secretário de Estado de Cultura, Hamilton Pereira da Silva, acredita que a cultura não pode ser vista apenas como um bom negócio: ela é antes um direito do cidadão, como saúde, transporte e educação. Por isso, há desafios que devem ser enfrentados pelo poder público. Entre eles, tornar republicanas as relações entre Estado, artistas e produtores; ser transparente na distribuição de recursos públicos; democratizar o acesso e descentralizar a distribuição dos recursos; garantir e estimular a pluralidade das expressões culturais. Segundo o secretário, enfrentar essas dificuldades significa que o princípio da impessoalidade não pode ser aplicado à cultura como no sistema fordista. "O mecenas deixou de ser privado e foi incorporado pelo Estado", acredita o secretário.
O Ministério Público de Contas foi representado na audiência pública pelo procurador Demóstenes Albuquerque. Para ele, o recurso público aplicado em cultura também deve seguir as regras republicanas. Segundo o procurador, "todos devem concordar com a aplicação do 'núcleo duro' do princípio da impessoalidade, que significa que o acesso ao recurso público independe do governo de plantão".
"Estamos diante do desafio filosófico-jurídico de adequar a atividade artística à legislação", afirmou o coordenador do FAC, Leonardo Hernandes. Para ele, a concentração de recursos existe, mas é geográfica e de classe social. Para mudar esse quadro, Hernandes apresentou algumas propostas: criar categorias distintas nos editais, separando novos realizadores de artistas experimentados; criar sistemas de pontuação mais elaborados; tornar a gestão do FAC mais eficaz, democrática e transparente.
Para a bailarina Rosa Coimbra, conselheira de Cultura do DF, com o aumento dos recursos, os problemas também aumentaram. "Ainda não chegamos ao modelo ideal, mas não é possível parar o mercado cultural". A artista acredita que, no caso dos produtos culturais, é difícil atingir o princípio da impessoalidade . "A pessoalidade, ou seja, a capacidade do artista, determina a qualidade do projeto", afirmou.
O princípio da impessoalidade, segundo a assessora jurídica da Secretaria de Cultura, Andreza Ferreira, é plenamente atendido pelos editais. No entanto, ela ressalva que a objetividade absoluta não é possível em relação à seleção de manifestações artísticas. "A própria lei de licitações reconhece o caráter peculiar do artista", lembrou a assessora.
O diretor de teatro Ricardo Guti também concorda que a impessoalidade é fundamental nos processos de seleção. No entanto, a área cultural é bastante específica. "Como podemos estabelecer critérios objetivos?", questionou.