Ação estava suspensa aguardando definição sobre a aplicação da Lei Anticrime ao caso; réu teria prejudicado mais de 60 vítimas com exames falsificados
O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) obteve decisão favorável da 3ª Turma Criminal para prosseguimento da ação penal contra um dos proprietários da Clínica do Povo, em Samambaia. Ele foi denunciado pelos crimes de estelionato (46 vezes), falsificação de documento particular (61 vezes), exercício ilegal da Medicina e perigo para a vida ou a saúde de outrem.
O processo foi suspenso pelo juízo da 1ª instância em 2020 após a entrada em vigor da Lei 13.964/19, conhecida como Pacote Anticrime, que determinou a obrigatoriedade de representação das vítimas em ações por estelionato. O MPDFT recorreu e conseguiu revogar a decisão sob o argumento de que os depoimentos prestados no decorrer das investigações supriam a representação formal das vítimas no processo. O fato de terem procurado a delegacia para narrar os fatos e auxiliar na apuração do crime já seria uma demonstração válida de interesse pela atuação judicial.
A denúncia chegou a ser recebida em julho de 2017, mas estava suspensa aguardando a definição do Tribunal de Justiça. Com a retomada do andamento da ação, o próximo passo deve ser o agendamento de interrogatório do réu, que precede a sentença do juiz de 1ª instância.
Entenda o caso
De acordo com a denúncia da Promotoria de Justiça Criminal de Defesa dos Usuários dos Serviços de Saúde (Pró-vida), entre março e novembro de 2017, o réu exerceu a profissão de médico sem autorização legal, pois não possuía a formação acadêmica necessária. Ele se apresentava como médico do trabalho, dizendo-se apto para realizar exames clínicos admissionais. Para isso, utilizava carimbos de médicos contratados pela clínica.
Ele também foi denunciado por falsificar exames laboratoriais de diversos pacientes. As amostras coletadas não eram enviadas ao laboratório: o réu falsificava os laudos e recebia os valores como se tivesse havido a análise, mas replicava resultados de pacientes anteriores.
O objetivo do réu era obter vantagem econômica ilegal. Pelo preço de um laudo verdadeiro, ele lucrava dezenas de vezes, replicando o resultado para inúmeros pacientes sem relação com o material biológico examinado. “Os documentos falsificados eram entregues às vítimas que, induzidas em erro, acreditavam que o resultado recebido era referente à amostra que coletaram na Clínica do Povo. Ludibriadas, pagavam vantagem econômica indevida por tais exames laboratoriais falsificados”, explica a denúncia.
Ao entregar resultados de exames falsificados, o réu colocou em risco a saúde dos pacientes, o que configura o crime de exposição a perigo de vida. Para a Pró-vida, essas condutas têm o poder de causar um grande dano social, pela quantidade de pessoas que frequentava a clínica devido ao valor acessível de exames. "A gravidade das condutas do acusado merece avaliação e resposta Estatal contundente. A população de Samambaia correu sérios riscos em virtude de uma exploração econômica criminosa, mediada por fraudes praticadas com ousadia e extrema reprovabilidade", argumenta a promotora de Justiça Alessandra Morato, titular da Pró-Vida.
Página 492 de 670