Existem, no Lago Sul e no Lago Norte, 891 passagens de pedestres, das quais 807 (91%) estão obstruídas
A Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística (Prourb) recomendou que a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh) cancele a consulta pública, marcada para o dia 17 de novembro, sobre o projeto de lei que pretende autorizar a outorga de áreas públicas vizinhas às residências particulares nos Lagos Sul e Norte. O projeto vai de encontro à decisão judicial transitada em julgado, atualmente em fase de cumprimento de sentença, que determinou a desobstrução das passagens irregularmente ocupadas ou obstruídas nessas regiões. De acordo com o PL, apenas 64 das 891 passagens não estariam sujeitas à autorização de uso de área pública.
No documento, a Prourb sustenta a necessidade de consulta prévia ao Instituto Brasília Ambiental (Ibram), ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), aos conselhos gestores das Áreas de Proteção Ambiental (APAs) atingidas e aos órgãos responsáveis pela política local de mobilidade urbana, além da obrigatoriedade de realização de audiência pública, com a observância dos prazos e exigências previstos em lei para garantir a efetividade da participação popular.
Segundo os promotores que assinam o documento, “Chama a atenção o fato de que a consulta pública tenha sido aberta poucos dias depois de audiência realizada pela Vara de Meio Ambiente, Desenvolvimento Urbano e Fundiário do DF, na qual foi fixado prazo de 30 dias para apresentação de novo cronograma de desobstrução das passagens do Lago Sul e do Lago Norte, em substituição ao que havia sido apresentado pelo DF-Legal, que previa a desobstrução até 2024". Outra questão é que o PL promove a desafetação e altera a destinação e o uso de áreas públicas, devendo, portanto, ser submetido a audiência pública, que deve ser convocada com pelo menos 30 dias de antecedência. "No caso, a Seduh abriu consulta pública com prazo de apenas nove dias para manifestação da sociedade, a despeito da complexidade da matéria".
A Prourb observa ainda que, no endereço disponibilizado pela secretaria (https://www.seduh.df.gov.br/consultas-publicas-2020), não há nenhum estudo ou informação técnica sobre o assunto. “Devido à natureza e complexidade da proposta, que tem consequências sobre a ordem urbanística, o meio ambiente, o patrimônio público e a mobilidade urbana, a realização de audiência pública mostra-se indispensável, mediante prévia disponibilização dos estudos e informações que subsidiaram a medida”, advertem os promotores.
Obstruções de alto impacto urbanístico
Um estudo da antiga Agência de Fiscalização do Distrito Federal (Agefis), avaliou em “alto”, “médio” e “baixo” o impacto de cada passagem obstruída prevista no projeto. São de baixo impacto aquelas de uso esporádico ou que dariam acesso a espaços com restrição à presença de público. As obstruções de médio impacto são as de uso eventual e as alto impacto, as que ocorrem em passagens de uso frequente ou cotidiano.
Verificou-se a predominância de obstruções de alto impacto sobre os percursos realizados diariamente pelos usuários de transporte público, tanto no Lago Sul quanto no Lago Norte. No total, foram identificadas 437 passagens com alto impacto urbanístico. As passagens classificadas como de médio impacto somam 286 das 891 cadastradas.
Histórico
A Prourb ajuizou ação civil pública, em 2012, questionando a situação, que perdura ao longo dos anos, na qual os moradores buscaram ampliar cada vez mais a área dos próprios lotes, à revelia do interesse da coletividade e da própria fiscalização. A Agefis foi condenada a elaboração, apresentação e execução de um cronograma para a desobstrução de todas as áreas públicas localizadas entre os lotes situados nos finais das quadras residenciais sem saída, irregularmente ocupadas e obstruídas por particulares no SHIN e SHIS.
Em 2018, após o trânsito em julgado da ação, foi iniciado o cumprimento da sentença pela Agefis, hoje Secretaria de Estado de Proteção da Ordem Urbanística do Distrito Federal (DF Legal), que chegou a apresentar um primeiro cronograma. Desse planejamento, a Agefis cumpriu somente a primeira etapa, consistente no georreferenciamento e classificação das obstruções, com levantamento de seu porte, natureza, material construtivo e impacto urbanístico, bem como dos infratores responsáveis pela demolição.
A identificação dos infratores e a condução dos processos administrativos previstos para ocorrer em 2019 não foram realizadas, tampouco as operações de demolição previstas para serem iniciadas em 2019 e finalizadas em 2021. Depois de muita cobrança por parte do Ministério Público, o Distrito Federal apresentou um segundo cronograma, que previa a desobstrução até dezembro de 2024. Para garantir a celeridade necessária, foi realizada uma audiência judicial no dia 27 de outubro de 2020, na qual o Distrito Federal foi instado a apresentar novo planejamento em 30 dias. Paralelamente, o Distrito Federal ajuizou ação rescisória perante o Superior Tribunal de Justiça (STJ) com o intuito de desconstituir a sentença que determinou a desobstrução das passagens do Lago Sul e do Lago Norte.
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