Durante o encontro, foram lançadas cartilhas orientativas para profissionais de saúde e pessoas que optem por entregar seus bebês para adoção
A Promotoria de Justiça de Defesa da Infância e Juventude (PJIJ) recebeu na última sexta-feira, 27 de outubro, profissionais da área de saúde, do direito e da rede de proteção à infância para a roda de conversa “Diálogos sobre entrega voluntária de bebês em adoção na perspectiva da proteção integral”. Na ocasião, foram lançadas as cartilhas orientativas para gestantes e profissionais que atuam na área de atendimento a pessoas que possam manifestar interesse na entrega legal de bebê para adoção. Os materiais foram produzidos a partir de uma parceria do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e a Secretaria de Saúde (SES).
A cartilha voltada para profissionais da saúde, além de informações sobre os direitos garantidos por lei, destaca orientações sobre a importância do sigilo na entrega e como acolher sem julgamento a decisão da parturiente, como evitar a revitimização e oferecer acompanhamento psicológico, entre outros cuidados que devem ter as equipes desde o pré-natal. Já a publicação destinada às gestantes desmistifica mitos e medos mais comuns e diferencia o procedimento legalizado, assistido pela Justiça, da entrega direta do bebê ou criança a terceiros. Clique para ter acesso às cartilhas: Profissionais e Gestante.
Além das cartilhas, também foi lançado o folder orientativo sobre gravidez na adolescência. No material, as jovens encontram diversas informações a respeito dos sinais no corpo e endereços para buscarem acompanhamento, além de orientações para casos de a gestação ter sido fruto de uma violência sexual. Clique para visualizar o folder “Será que estou grávida? E agora?”.
Durante o evento, a promotora de Justiça da Infância e Juventude Luísa de Marillac afirmou que a construção das cartilhas foi feita de uma forma dialógica, participativa com as instituições que integram o Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente: “Esses produtos têm um pouco de cada um dessa rede e em suas entrelinhas encontramos respeito, pois temos aqui o desafio de uma postura civilizatória diferente. É importante para quem faz os atendimentos, mas também para que as cidadãs possam compreender melhor seus direitos e buscar os caminhos adequados para o atendimento dos seus interesses, sempre na perspectiva da garantia e do melhor interesse para todos os envolvidos”.
Participações
Danielle Lima, pediatra e diretora de Atenção Secundária e Integração de Serviços da Secretária de Saúde do DF (SES/DF), parabenizou a iniciativa de tratar como tema uma situação tão recorrente, mas que ainda é tabu em nossa sociedade. Para Juliana Soares, médica de família e gerente de Atenção à Saúde às Populações em Situação Vulnerável e Programas Especiais da SES, “tem uma linha de cuidado por trás do lançamento dessas cartilhas. A gente fez questão de trazer uma linguagem fácil e acessível, principalmente para pessoas em situação de vulnerabilidade, que muitas vezes não têm acesso à informação”.
A psicóloga da Secretaria de Saúde Shyrlene Brandão esteve presente e relembrou todo o início, quando debatia com sua equipe como auxiliar as pessoas que estão diante de uma gestação indesejada. “É uma cartilha feita a muitas mãos e era importante deixar claro para a gestante que ela tem seu direito sexual reprodutivo e pode escolher a não maternidade, sem ser criminalizada ou tachada de desumana”. Ela frisou ainda a importância de o material utilizar uma linguagem inclusiva, ampla e respeitosa e que as pessoas tenham acesso às orientações também por meio de profissionais acolhedores que possam oferecer uma escuta qualificada.
Segundo Priscila Nolasco, gerente de Serviço Social da Secretaria de Saúde, “é importante acompanhar essa mulher, para que se possa garantir uma entrega com respeito por esse momento, e que também possa receber esse suporte, e a cartilha vem no sentido de orientar os profissionais de saúde e evitar novas histórias de violação de direitos. Essas pessoas são muito julgadas, e quando ela está bem orientada com relação às suas possibilidades e seus direitos, isso é um fator de proteção em relação a essa entrega e minimiza riscos do próprio abandono”.
Para Camila Lucas, defensoria pública, do Núcleo de Atendimento da Infância e Juventude, “é fundamental respeitar o direito dessa genitora de optar pelo não exercício da maternidade e ter esse cuidado no acolhimento desde o momento que ela procura tanto a rede de saúde quanto a Justiça”. Renata Marinho Lima, secretária Adjunta de Desenvolvimento Social, acrescenta outro olhar: “A entrega legal de bebês é um direito que precisa ser propagado, mas percebemos que a quase totalidade das pessoas que fazem essa opção estão em situação de vulnerabilidade. Temos uma linha muito tênue entre o exercício do direito de entregar a criança e a violação do direito de maternidade. Quando a mulher faz essa escolha porque ela não vê uma outra opção na vida dela, ou seja, porque não tem condições, não tem apoio, não tem suporte, isso não é necessariamente exercer um direito”.
Redivaldo Dias Barbosa, juiz substituto da 1ª Vara da Infância e da Juventude (VIJ-DF), explica que “quando se garante a proteção às mulheres, protege-se também o infante, porque ele tem direito à proteção desde a sua concepção”. Ele completa: “Nosso primeiro sentimento quando sabemos de uma mulher que deseja entregar sua criança é de julgamento, de convencê-la a mudar de opinião, mas não conhecemos a realidade dela ou não sabemos mensurar sua dor. Ela quer que essa criança se desenvolva. E sabendo que não tem essa condição, ela resolve abrir mão para que essa criança encontre uma família que possa dar essa oportunidade. É um processo de luto, de dor para ela também. É um ato de amor”.
Supervisor do Centro de Referência para Proteção Integral da 1ª VIJ-DF, o psicólogo Reginaldo Torres, afirma que o objetivo é olhar para a criança como membro daquela família. “É um trabalho muito cuidadoso, um olhar personalizado que pensa o que pode favorecer um bom desenvolvimento de uma criança naquela família, identificar fatores de risco e como trabalhar para revertê-los em prol da proteção dessa criança”. O profissional explica que há casos de desistência na entrega após alguns meses e isso é um direito da genitora e é importante oferecer apoio e acompanhamento da rede: “Nosso foco então é pensar naquela criança junto daquela mãe”, completa.
Entrega Legal
A entrega voluntária para adoção está prevista legalmente no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Com a Lei 13.509/2017, a “Lei da Adoção”, foi consagrado o direito ao sigilo da entrega, à possibilidade de a mãe ser titular de ação voluntária de extinção do poder familiar, de receber assistência psicológica, de ser ouvida em audiência judicial e à retratação da entrega. Já o infanticídio, o abandono, a venda de crianças, a entrega a terceiros sem intermediação da Justiça Infantojuvenil e o registro indevido de filhos são crimes.
A Justiça da Infância e Juventude é o local responsável pelos processos de adoção. O Ministério Público, a Defensoria Pública e o Conselho Tutelar podem colaborar com as informações jurídicas. Todos os serviços de saúde (UBS, UPA, hospitais etc.) devem prestar informações e acolher a demanda pela entrega, encaminhando a gestante à Vara da Infância e Juventude.
Conheça as cartilhas:
Entrega voluntária para adoção: Orientações para profissionais
Entrega voluntária para adoção: Orientações para gestantes
Folder “Será que estou grávida? E agora?”.